Valor Econômico – As concessionárias de rodovias e ferrovias que usam debêntures incentivadas para financiar seus projetos poderão reutilizar a partir de agora o lastro de emissões anteriores para uma nova operação. A medida é válida desde que a nova emissão tenha como objetivo financiar o pagamento da anterior, segundo uma portaria publicada nesta semana pelo Ministério dos Transportes.
A mudança deve elevar o número de ofertas e permitir que as empresas captem com prazos mais curtos, com a garantia de que lá na frente não precisarão de um novo lastro quando for necessário fazer a rolagem da dívida.
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Para George Santoro, secretário-executivo do Ministério dos Transportes, a possível “reemisão” dos papéis deve ajudar as companhias a mitigar o risco de variação da taxa de juros. “Hoje os juros estão numa crescente, mas, se o estresse do mercado melhorar e a questão fiscal for resolvida, será possível pensar em uma redução. A possibilidade de emitir com prazo curto e reemitir com uma taxa mais baixa vai ajudar a resolver o desafio que é lidar com os investimentos iniciais, que são mais pesados”, disse ao Valor.
A emissão mais curta e a mais longa terão o mesmo lastro, mas serão operações feitas a mercado de forma independente. No momento do vencimento, os investidores recebem normalmente a remuneração e, a partir daí, poderão escolher se querem ou não alocar os recursos nos papéis mais longos.
A alta dos juros e o cenário econômico mais instável têm levado empresas a buscarem formas de não “travar” a taxa das dívidas em um nível alto por um longo prazo, incluindo a emissão de papéis de seis a quatro anos, que é o prazo mínimo previsto na lei, como informou o Valor em fevereiro. O prazo médio de uma debênture desse tipo ficou em 12,9 anos em 2024, chegando a 20 anos em alguns casos.
Ainda não estava claro, no entanto, se no momento do vencimento desses papéis mais curtos seria possível usar o mesmo lastro ou se seria necessário usar um outro projeto para fundamentar a nova emissão.
Para Santoro, outras pastas devem seguir o mesmo caminho e criar portarias para esclarecer o tema. Além de concessionárias de rodovias, são emissores frequentes desse tipo de papel as companhias de energia e saneamento.
O secretário-executivo acredita que os papéis com prazo mais curto encontrarão demanda no mercado, mas que é possível que investidores como fundos cobrem um prêmio adicional por isso. “Não sabemos ainda como o mercado irá cobrar esses papéis, mas sabemos que há interesse. Tivemos conversas com bancos e fundos e todos viram com bons olhos a reemissão das incentivadas”, afirmou Santoro.
Para as gestoras, investir em títulos mais curtos pode ser positivo devido ao impacto no “duration”, uma métrica que mede a sensibilidade do valor dos ativos às variações da taxa de juros. O “duration” mostra em quanto tempo o investidor deve recuperar o valor investido mais juros, levando em consideração os fluxos de pagamentos, como juros e amortizações.
Em ciclos de alta dos juros, as assets podem se interessar por papéis mais curtos, considerando a redução da volatilidade na marcação a mercado, segundo relataram algumas casas à reportagem em fevereiro.
Do lado das empresas, a medida também foi bem recebida, diz Santoro. “Conversamos com quase todas as operadoras que participam de leilões e eles têm uma expectativa de aumento do mercado de debêntures incentivadas.”
O incentivo à reemissão também deve fazer com que menos companhias busquem os chamados “empréstimos-ponte”, contratados diretamente com bancos e que podem ter um custo maior do que os papéis incentivados.
A carteira de concessões e repactuações prevista para 2025 inclui investimentos na casa dos R$ 160 bilhões, no caso das rodovias, e de cerca de R$ 50 bilhões em ferrovias, volume que deve ser financiado ao longo dos próximos, segundo Santoro. “O BNDES continuará tendo um papel como âncora, mas não será exclusivo. Ele deve manter a participação de 40% a 60% e o mercado de capitais entrará com um volume maior”, aponta.
Em 2024, o volume de debêntures incentivadas atingiu recorde de R$ 135 milhões, ante R$ 67,8 bilhões no ano anterior, segundo a Anbima. O volume correspondeu a quase 30% de toda a captação com debêntures no ano.
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