Guerra privatizada

Entrevista com Marco Polo de Mello Lopes, vice-presidente executivo do Instituto Brasileiro de Siderurgia – IBS

É raro encontrar na história das relações econômicas uma disputa tão explícita como a que opôs, a partir da privatização da Vale, em 1997, esta empresa mineradora e as usinas siderúrgicas do Instituto Brasileiro de Siderurugia – IBS. Normalmente divergências deste tipo se resolvem com a aquisição de um concorrente pelo outro ou com a divisão de mercado. Mas, no caso, isso parece pouco provável. De um lado a CVRD terá dificuldade em continuar comprando os concorrentes, impedida pela Secretaria de Direito Econômico – SDE — e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade. E de outro lado não restam mais concorrentes a comprar. Todos os mineradores de porte – leia-se MBR, Samitri, Ferteco e Socoimex – já fazem parte da Vale.
A disputa no entanto se agrava com os planos da CVRD de entrar na produção de aço e a intenção da CSN de virar exportadora de minério. A arena é a logística, em especial a MRS, onde, depois da aquisição da Ferteco e da MBR, a Vale ficou com uma participação de 38% do capital votante, quando pelas normas legais, deveria ter no máximo 20%. Sendo a ferrovia um instrumento vital para a sobrevivência da siderurgia, compreende-se porque o IBS esteja tão alarmado com o avanço da Vale neste setor.
No passado esse tipo de disputa, envolvendo acesso a matérias-primas e fabricação de bens estratégicos, era preocupação dos estadistas, e quando eles não conseguiam resolver o problema – ou quando queriam “fazer política por outros meios”, no dizer de Clauswitz – declaravam guerra uns aos outros.
No mundo civilizado de hoje não é mais assim e a expectativa é que os mecanismos do mercado, auxiliados pelos organismos antitruste e pelas agências reguladoras, sejam capazes de dirimir as questões. Convidamos os leitores a acompanhar esta entrevista do vice-presidente executivo do IBS, Marco Polo de Mello Lopes e a fazer seu próprio julgamento sobre a possibilidade de uma solução moderna, portanto sem guerra, entre a Cia. Vale do Rio Doce e a indústria siderúrgica brasileira.

Revista Ferroviária – Por que a briga das usinas siderúrgicas com a Vale?
Marco Polo –
Não é uma questão nova. Sempre vivemos esse problema aqui no IBS. No fim de 2001, as usinas se reuniram para tentar evitar a concentração da logística pela Vale. Mas a oposição sempre foi muito forte, e sempre em cima de uma ou outra usina isolada, dificultando a unidade. No entanto o tratamento que a Vale dava ao nosso setor fez com que fosse sendo criada devagarinho uma unidade interna.

RF – Unidade em torno do quê?
Marco Polo –
Se olharmos o tipo de carga que as usinas movimentam, minério, carvão, produto acabado, vemos que não tem outra solução econômica senão a ferrovia. Pode-se pensar em escoar alguma coisa pelo rodoviário, mas a ferrovia será sempre uma questão vital para o setor. Colocamos aqui no IBS como espinha dorsal o seguinte: queremos um ambiente logístico concorrencial.

RF – Qual a importância da logística para a siderurgia brasileira?
Marco Polo –
A siderurgia brasileira produziu no ano passado 31,6 milhões de toneladas de aço bruto e exportou 12,5 milhões de produtos acabados e semi-acabados. Consumiu, para produzir esses aços, cerca de 47 milhões de toneladas de minério de ferro e carvão, e ainda vários outros insumos. Todo esse minério e carvão, além de parcela importante dos produtos para exportação, são cargas tipicamente ferroviárias, não existindo alternativas economicamente viáveis para seu transporte. A siderurgia brasileira é a maior consumidora de minério de ferro do País e uma das maiores usuárias do transporte ferroviário. Realizou, nos últimos 10 anos, investimentos de US$ 13,9 bilhões para atingir a capacidade atual de 35 milhões de toneladas/ano. E já iniciou um novo ciclo de investi

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Fonte: Folha de São Paulo

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