Além das reivindicações específicas dos trabalhadores, o momento indica um acúmulo de insatisfação social, política e econômica. Mas os governos conservadores, sobretudo o de Sarkozy, na França, decidiram enfrentar a maré, porque sabem o que está em jogo.
Há algo nos trilhos além dos trens de carreira, se me permitem parodiar o Barão de Itararé. Os momentos eleitorais vão confirmando o assente conservador pela Europa afora. Primeiro foram a Polônia e a Suíça, aquela afastando um governo de extrema-direita em favor de um de centro-direita, esta reelegendo um governo de direita com laivos de xenofobia. Depois, mais recentemente, a Dinamarca confirmou seu governo conservador.
Ao mesmo tempo, no espectro à esquerda e nos movimentos de trabalhadores as tintas vão se carregando de tons mais rubros do que o comum nas últimas décadas.
POD NOS TRILHOS
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Na Alemanha os ferroviários vêm há mais de um mês fazendo paralisações com datas definidas, elevando a intensidade e a duração das mesmas. Na semana passada os trens de carga e de passageiros, mais os trens que se poderiam chamar de “suburbanos” em muitas cidades, inclusive em Berlim, pararam totalmente. E o movimento continua, agora com ameaças de uma greve por tempo indeterminado.
A malha ferroviária da Alemanha é importantíssima não só para o país como para a Europa inteira. Sem os trens alemães as indústrias belgas e holandesas, além de outras, param completamente. Na Alemanha uma greve prolongada no sistema pode provocar problemas de desabastecimento de tudo, e agora em pleno fim de outono e começo de inverno.
Ao contrário do que se pensa no Brasil, o transporte ferroviário na Europa e, em particular, na Alemanha é muito caro, e, se é extenso e intenso, tem uma certa aura de ineficiência. Os metrôs urbanos e suburbanos não: são caros para o turista, menos caros para o usuário cotidiano (um passe mensal para o metrô de Berlim, urbano e suburbano, custa 70 euros, mais ou menos 170 reais), mas são eficientes.
Esta greve na Alemanha tem motivações salariais imediatas. Dados de pesquisa mostram que, embora longe do que se vê no Brasil, a concentração de renda na Alemanha está aumentando, e trava-se uma batalha infindável em torno do sistema de seguridade social, com os conservadores empilhando propostas de restringi-los passo a passo. Na linha de frente da greve estão os maquinistas e seu sindicato. Mas outras categorias de trabalhadores ferroviários ameaçam também entrar em greve se as eventuais vantagens obtidas pelos maquinistas não lhes forem estendidas.
Na mais recente escaramuça da batalha houve um cisma no governo de coalizão entre democrata-cristãos (conservadores) e social-democratas (menos conservadores), que pode ter conseqüências maiores na organização política do país e da Europa. O vice-primeiro-ministro e ministro do Trabalho, Franz Müntefering, do Partido Social-Democrata (SPD), renunciou a seus cargos há cerca de dez dias. Müntefering pertence a uma geração de políticos da social-democracia que, liderados por Gehrard Schröder, se aproximaram do pensamento conservador da União Democrata-Cristã (CDU), da primeira-ministra Angela Merkel. Introduziram reformas de caráter liberal no corpo da seguridade social e da administração pública alemã.
Respeitado e tido como político sóbrio, Müntefering era o fiel da balança, pelo lado social-democrata, da coalizão que governa a Alemanha desde a vitória apertada do partido de Merkel. Em público, explicou que sua saída se devia a razões pessoais, pois sua esposa está em fase delicada de doença incurável. Entretanto, o cenário político apertou-se consideravelmente para ele, o que pode ter determinado a decisão.
No plano imediato Müntefering viu-se numa posição difícil porque o governo de Merkel decidiu majoritariamente não atender a uma das proposições de seus aliados do SPD, qual seja, a de estabelecer um salário mínimo para os trabalhadores dos Correios, outro setor vital da eco
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