Licitação de 15 trens pela Trensurb vira alvo do PSDB

Respingou no Rio Grande do Sul a tentativa do governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB) de dividir com outros partidos e governos o desgaste das denúncias de cartel em licitações de metrô em São Paulo.


O PSDB questiona a compra de 15 trens feita pela Trensurb, no valor de R$ 243,7 milhões, do consórcio formado pela Alstom e CAF — ambas citadas no caso paulista.


As duas empresas também venderam 10 trens à Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) em Belo Horizonte. Nas duas licitações, não houve concorrência.


Na quarta-feira, no programa Gaúcha Atualidade, a procuradora da República de São Paulo Karen Jeanette Kahn, que acompanha as investigações sobre o cartel paulista, disse que estão sendo apuradas outras licitações federais, mas não especificou quais seriam:


— Temos um material que chama atenção para a possível prática de cartel em outras regiões do país.


O órgão vai solicitar à CBTU e à Trensurb os documentos das compras realizadas em 2012. O pedido é um desdobramento do turbilhão criado em São Paulo após o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) abrir investigação, diante de denúncia da multinacional Siemens, sobre a formação de cartel durante os governos tucanos de Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin.


Atacado por petistas, o PSDB responde. Alckmin e as bancadas na Câmara e Senado sustentam a ocorrência de cartéis em outras Capitais e com recursos federais, como Porto Alegre e Belo Horizonte, já que Trensurb e CBTU são ligadas e recebem dinheiro do Ministério das Cidades. É a tentativa de envolver o governo do PT e siglas aliadas no escândalo.


Com base no material entregue pelo Cade, o PSDB levanta dúvida sobre as compras dos trens no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais. Nos dois casos, venceu a parceria formada por Alstom e CAF, única a apresentar proposta, sendo que as companhias revezaram o controle do consórcio. As licitações foram feitas pelo Regime Diferenciado de Contratações (RDC).


— O Cade tratou a questão de forma política e partidária. É preciso investigar com profundidade todos os casos suspeitos de cartel e não só o de São Paulo — defende o deputado Nelson Marchezan (PSDB-RS).


Dois processos marcados por semelhanças


As duas licitações citadas pelo governador Geraldo Alckmin, envolvendo a Trensurb, de Porto Alegre, e a CBTU, de Belo Horizonte, têm mais semelhanças do que diferenças: foram realizadas no mesmo período, tinham como objeto a compra de trens pelo governo federal e receberam apenas uma proposta, de um consórcio formado por duas empresas, a francesa Alstom e a espanhola CAF.


Mudou apenas o endereço da entrega dos veículos, a partir de 2014, o nome dos consórcios e o percentual de cada companhia nos contratos, que, juntos, somam R$ 415,72 milhões.


Ambas as concorrências também foram feitas via Regime Diferenciado de Contratações (RDC), instituído em 2011 para “ampliar a eficiência nas contratações públicas e a competitividade entre os licitantes”.


O resultado do processo de compra de 15 trens unidades elétricas (TUEs) para a Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre S/A (Trensurb) saiu em 12 de novembro. Com valor de R$ 243,76 milhões (0,1% abaixo do previsto), o consórcio vencedor foi o FrotaPoa (Alstom 87,3% e CAF 12,7%).


No dia seguinte, a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) também publicou o desfecho do certame: os 10 trens seriam adquiridos do consórcio FrotaBH (Alstom 6,86% e CAF 93,14%), por R$ 171,96 milhões.


Procurada, a Trensurb informou desconhecer que as mesmas empresas disputavam o processo em Belo Horizonte. A assessoria disse que a licitação deu preferência para produtos fabricados no Brasil e que, desta forma, o produto vencedor seria nacional, mesmo com valor 20% maior que o do produto estrangeiro com menor preço ofertado.


A medida, conforme nota, tem por objetivo “movimentar a economia com a geração de novos postos de trabalho no país”.


Quanto ao preço, a empresa alegou ter feito pesquisa de mercado antes do lançamento do edital para aquisição. A ordem de serviço para compra foi assinada pela presidente Dilma Rousseff no final de 2012, durante ato em Caxias do Sul.


O que dizem as empresas envolvidas


CBTU 


 “Todo o processo licitatório realizado pela CBTU atendeu rigorosamente a legislação em vigor, bem como as recomendações do Tribunal de Contas da União.”


Até agora, R$ 8.110.236,02 foram pagos, o equivalente a 5% do valor estabelecido no contrato. A companhia tem sede no Rio de Janeiro e opera em Belo Horizonte (MG), João Pessoa (PB), Maceió (AL), Natal (RN) e Recife (PE).


Trensurb 


“A Trensurb realizou audiência pública anterior ao lançamento do edital e, na oportunidade, mais de 10 empresas do setor ferroviário estiveram presentes, ocasião em que foram apresentadas as especificações técnicas para possibilitar ampla participação e competitividade.”


A empresa, que opera linha de metrô de superfície, ainda estima redução de R$ 22,55 milhões do montante global do contrato, a partir da suspensão de recolhimento de PIS/Pasep e Cofins.


Alstom 


“Os contratos são objetos de licitação pública, onde são respeitados os marcos legais aplicáveis. A empresa reforça que segue um rígido código de ética (…), de maneira a respeitar todas as leis e regulamentações, e aplica um processo interno para prevenir infrações.”


CAF


Representantes da empresa não foram localizados pela reportagem.


Os trens do Rio Grande do Sul


Para Porto Alegre, serão fornecidos 60 carros de passageiros (15 trens de quatro carros), que serão fabricados em São Paulo, na unidade Lapa da Alstom. Com vida útil estimada em 30 anos, os novos veículos terão equipamento de ar condicionado com regulagem automática, sistema de comunicação multimídia, painéis com mapa dinâmico da linha, iluminação interna com LED, dispositivos de fixação de bicicletas, módulos para cadeirantes e sistema de detecção de incêndio, entre outros.


A suposta fraude em SP


— O governo de São Paulo lança licitações para compra e manutenção de trens e para construção e conservação de linhas férreas e metrôs.


— Há 20 anos o Estado é administrado pelo PSDB, tendo sito governado por Mário Covas, José Serra e, atualmente, Geraldo Alckmin.


— Grande multinacionais estrangeiras fariam acordos para fraudar concorrências e conseguir superfaturar contratos. Estariam envolvidas a alemã Siemens, a francesa Alstom, a canadense Bombardier, a espanhola CAF e a japonesa Mitsui.


— Com a formação do cartel, as empresas combinariam preços e condicionariam a derrota de um grupo delas à vitória em outra licitação, que também estaria viciada.


— O esquema envolveria dirigentes de duas estatais — Metrô e Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) — e políticos do PSDB. Os dirigentes das estatais fariam pagamento de propina a tucanos.


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