Quem diria que cinco milhões de pessoas por ano andariam em cima de velhos trilhos de trem, ouvindo barulho de buzinas de carro e da construção de prédios, olhando o rio Hudson de um lado, hotéis, restaurantes e lojas do outro? Esse é o parque High Line, construído em trilhos de trem suspensos abandonados na zona oeste de Manhattan e hoje um dos destinos turísticos mais populares de Nova York.
Desde que sua primeira parte foi inaugurada, em 2009, o parque se tornou um exemplo de paisagismo e passou a ser imitado no mundo inteiro. E agora que está completo, indo da rua Gansevoort até a rua 34, o High Line está transformando completamente a ideia do que um parque urbano pode ser, tanto em termos arquitetônicos como no modelo de financiamento.
“O parque foi desenhado com a ideia de constante conexão com a cidade”, disse Paul Goldberger, crítico de arquitetura da revista “Vanity Fair”, sobre o projeto criado pelas empresas James Corner Field Operations e Diller Scofidio & Renfro. “É um novo modelo de parque. É um parque para integração, não separação ou remoção do ambiente urbano, mas conexão com ele.”
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
E a nova fase do High Line transforma ainda outra vez o que o parque traz para a cidade. Até agora, ia de Sul a Norte. Na nova etapa, que começa na rua 30, os trilhos suspensos viram para a esquerda e chegam até a extremidade oeste de Manhattan, oferecendo uma nova perspectiva de visão dos arredores.
Nessa fase, os trilhos contornam um enorme estacionamento de trens, que está sendo transformado em um dos maiores projetos urbanos de Nova York. Chamado Hudson Rail Yards, o empreendimento prevê uma plataforma em cima do estacionamento, onde serão construídos edifícios comerciais e residenciais.
“Eu amo essa nova fase do parque,” disse Goldberger. “Ela é quase como uma metáfora para a própria cidade. Você vai de uma área fechada para uma aberta, de grandes vistas a se sentir mais introspectivo, de multidões à solidão.”
O High Line só existe por causa de dois artistas. Joshua David, escritor, e Robert Hammond, pintor, se conhecerem numa reunião de bairro em 1999. Descobriram que tinham em comum a ideia de dar utilidade aos trilhos suspensos, abandonados desde 1980 e em risco de ser removidos.
Nos dez anos seguintes, eles lideraram uma campanha de arrecadação de fundos e de apoio político. As primeiras duas fases do parque custaram US$ 152 milhões, dos quais US$ 44 milhões foram arrecadados pela organização que criaram, chamada Amigos do High Line.
A última fase custou US$ 35 milhões. Com essas cifras, o High Line é provavelmente um dos parques mais caros da história em termos de custo por metro quadrado. Peter Mullen, vice-presidente-executivo da Amigos do High Line, explicou que o alto custo se deve em parte a grandes investimentos na estrutura e também porque a manutenção do parque é intensa, quase como de um museu. Mas ali também é gerada muita receita para a cidade. “O retorno de investimento da cidade em arrecadação de imposto chega aos 1.000%”, calcula Mullen. Goldberger concorda e comenta: “Provavelmente, nada transformou tanto a cidade de Nova York como o High Line.”
O High Line trouxe dezenas de novos empreendimentos para os arredores, incluindo o novo prédio do Whitney Museum, que será aberto no ano que vem, e um condomínio residencial desenhado pela famosa arquiteta Zaha Hadid, que está em construção na rua 28.
O High Line também se tornou um lugar de exibição de vários projetos de arte pública, incluindo um mural do artista americano Ed Ruscha que vai ficar em exposição na parede de um prédio na altura da rua 22 até maio.
Para a brasileira Gisela Gueiros, que tem um guia de arte em seu site taxiamarelo.com, o High Line tornou-se lugar obrigatório. “Sou apaixonada pelo High Line. Não é um parque para se ficar sentado, é para caminhar. Ele se move como sangue na veia, e você vê a cidade de um ângulo único, como se estivesse no terceiro andar de um prédio.”
O único problema do parque é que, de certa forma, acabou se tornando vítima do próprio sucesso: está sempre cheio de turistas, o que mantém os nova-iorquinos longe.
Numa sexta-feira de manhã recente, Carla Roland, pastora de uma igreja episcopal que mora no Harlem, estava visitando o parque novamente, a primeira vez em dois anos. Acompanhava sua irmã, que vinha do Texas. “O High Line está sempre tão lotado nos fins de semana que sempre desisto de vir aqui. É incrível ver como a região se transformou.”
Mullen reconhece que a lotação do parque é um problema e afirma que o objetivo é servir à comunidade local primeiro. “Os turistas virão, mas queremos continuar a fazer o High Line para os nova-iorquinos.” Sua entidade tem organizado programas educativos, como percursos para escolas locais, teatro e apresentações de arte. “O High Line é um híbrido entre um parque e uma instituição cultural. É um museu de alto padrão, de graça.”
O fato é que muitos nova-iorquinos nunca foram ao parque – entre eles, o prefeito Bill de Blasio. Em entrevista recente, ele, que antes morava no Brooklyn, admitiu que nunca colocou os pés no famoso parque: “Sou fã do parque, acho que ele fez muita coisa boa para a cidade, mas não visitei ainda”.
Esse é só mais um contraste entre De Blasio e seu antecessor, Michael Bloomberg, que doou milhões de dólares do próprio bolso para o High Line e falou com entusiasmo na inauguração do parque, em junho de 2009, “um extraordinário presente para o futuro da nossa cidade”.
Seja o primeiro a comentar