O processo de auditoria (due diligence) realizado pela
chilena Arauco nos ativos da fabricante de celulose Eldorado Brasil já
identificou pelo menos R$ 500 milhões em passivos e esse valor ainda pode
crescer no curso das apurações, disseram fontes a par do processo ao Valor. Esses
montantes vão pesar no fechamento do preço final da empresa controlada pela
J&F Investimentos.
O valor surpreendeu os chilenos. Todavia, a percepção é a de
que a firme intenção da Arauco de fincar bases no Brasil na produção de
celulose poderá garantir algum prêmio aos vendedores, diluindo parte desses
valores.
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Na área logística ferroviária, a companhia teria um passivo
da ordem de R$ 200 milhões com duas empresas do setor, referente a transporte e
venda de material rodante e vagões. Os chilenos também teriam relacionado uma
ação de R$ 100 milhões movida pela Fibria contra a companhia, por uso indevido
de um clone de eucalipto por ela registrado, e uma série de processos
tributários e trabalhistas. Nessa última área, seriam mais de 1,2 mil ações, as
quais não estariam provisionados de maneira adequada.
Além disso, o Ebitda da Eldorado seria inflado por créditos
de ICMS, lançados no balanço com um prêmio de até 30% que não devem ser
devolvidos pelo governo de Mato Grosso do Sul. Por isso, esse prêmio não pode
ser lançado na conta do resultado operacional, na avaliação de fontes do setor.
A variação do valor justo do ativo biológico – que deve ser feita por todos da
indústria – também é computada pela Eldorado no Ebitda, enquanto suas pares
refletem esse valor no patrimônio líquido.
Ao fim do ano passado, a empresa da J&F e dos fundos de
pensão Petros e Funcef era parte em processos de natureza ambiental, cível,
trabalhista e tributária no valor de R$ 436,7 milhões (incluindo os R$ 100
milhões da ação movida pela Fibria). Desse montante, apenas R$ 7,5 milhões
estavam provisionados.
Para negociar o ativo com exclusividade com a J&F, a
Arauco fez uma oferta inicial de quase R$ 14 bilhões – equivalente a dez vezes
o múltiplo de Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e
amortização). Com isso, a concorrente chilena tirou do jogo, num primeiro
momento, as brasileiras Fibria (grupo Votorantim e BNDES) e Suzano Papel e
Celulose.
O Valor apurou que os trabalhos de due diligence –
comandados por Santander e dois escritórios de advocacia (Mattos Filho e
Simpson Thacher & Bartlett – podem prosseguir até 2 ou 3 de agosto, com
chance de um desfecho antes desse prazo.
Fontes ouvidas pelo Valor indicaram que o preço justo da
Eldorado equivaleria a 8 vezes o Ebitda anual. No entanto, há quem pondere que
a Arauco poderá pagar um prêmio para fechar o negócio e, assim, marcar sua
entrada na produção de celulose no país.
A companhia chilena, que é uma das maiores empresas
florestais do Hemisfério Sul, planeja há anos fazer celulose no país e chegou a
comprar em 2011 um terreno em Inocência (MS), perto de Três Lagoas, onde está a
Eldorado, para erguer uma fábrica. Na região, a Arauco já tem 40 mil hectares
de florestas plantadas, mas os planos foram interrompidos pela proibição da
compra de terras por estrangeiros no país.
Entre 2013 e 2014, segundo fonte da indústria, o comando da
chilena se reuniu com o empresário Mário Celso Lopes, idealizador da Eldorado e
seu ex-acionista, para avaliar a potencial combinação de seus projetos de
celulose no país.
As conversas não prosperaram, mas os chilenos mantiveram-se
firmes na proposta de ter uma fábrica no país. Em determinado momento, conta
uma fonte do setor, a própria Eldorado fez uma oferta pela base florestal da
Arauco na região, mas ela não se interessou. “Os chilenos são
conservadores, mas arrojados em suas decisões de investimento”, observa um
interlocutor. Em 2009, lembra uma fonte, em parceria com a sueco-finlandesa
Stora Enso, ela aproveitou o momento financeiro complicado vivido pela
espanhola Ence e comprou a fábrica Montes del Plata, no Uuguai, onde já tinha
florestas.
O pagamento de prêmio pela Eldorado também se justificaria,
segundo outra fonte, pelas vantagens competitivas da produção de celulose no
Brasil. Aqui, o custo caixa – que é o mais baixo do mundo – pode ser até US$
100 por tonelada menor do que no Chile, o que eleva as margens do negócio.
Para analistas ouvidos pelo jornal chileno “Diario
Financiero”, é mais conveniente à Arauco a compra da Eldorado do que a execução
de seu projeto de expansão Mapa, que prevê a ampliação e modernização de uma
unidade no Chile com investimentos de US$ 2 bilhões. A preferência pela
aquisição do ativo brasileiro, indicaram os analistas, deve-se ao fato de que a
Eldorado adicionaria à Arauco Ebitda da ordem de US$ 500 milhões, quase o dobro
do que se estima para o projeto Mapa. Além disso, a compra, na visão deles,
traria a oportunidade de expansão da fábrica brasileira no curto prazo.
Fontes ouvidas pelo Valor disseram que as negociações com a
Arauco estão avançando, mas como ainda não chegaram a um ponto irreversível, a
mensagem enviada pelo vendedor a pelo menos outra companhia interessada no
ativo foi de que não “desmobilizasse seus times”. Fibria e Suzano têm
propostas e financiamento prontos para levar à J&F caso os chilenos
desistam do negócio.
Procurada, a Eldorado, não comentou as informações. Em nota,
informou que “por se tratar de transação confidencial, nenhuma informação
sobre a negociação será informada com antecedência”.
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