Impasses legais travam R$ 30,5 bi de investimentos em rodovias privadas

As concessionárias de rodovias federais amargam uma
intrincada lista de problemas. Apesar de cada empresa ser um caso particular e
muitas serem vítimas das próprias decisões equivocadas, especialistas em
infraestrutura apontam dois traços em comum no imbróglio: solução dos entraves
depende do poder público e sua protelação custa caro – paralisa R$ 30,5 bilhões
de investimentos na melhoria e expansão de estradas, segundo a Associação
Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR).

“É raro encontrar uma concessionária que não tenha alguma
discussão relevante com órgãos públicos afetando decisões de investimentos”,
diz a advogada Letícia Queiroz, especializada em infraestrutura. Há
indefinições contratuais por divergências entre órgãos públicos; morosidade do
governo para tomar decisões; dificuldade para garantir crédito e até
investigação na Operação Lava Jato.

Sob a gestão de 21 concessionárias estão 10 mil km de
estradas federais pedagiadas consideradas a espinha dorsal do sistema de
transporte nacional. A BR-163, no Centro-Oeste, rota de escoamento de grãos; a
Via-40, que liga Brasília à Minas Gerais; e as Auto Pistas Planalto Sul e
Litoral Sul, trechos da BR-116 e da BR-101, no Paraná e Santa Catarina, são
algumas delas.

O Estado entrou em contado com todas e comprovou a
diversidade de problemas regulatórios. “As dificuldades costumam variar de
acordo com a etapa em que a concessão foi feita”, diz Cláudio Frischtak, da
Inter.B Consultoria Internacional de Negócios. A primeira etapa, por exemplo,
ocorreu nos anos 90.

A preocupação é de que maneira a concessionária entrega a
estrada, pois os contratos não preveem prorrogação. Algumas empresas, porém,
alegam que há obras que não podem esperar, e se propõem a fazê-las em troca de
um tempo a mais na concessão. Cerca de R$ 6 bilhões de investimentos dessa
ordem foram engavetados porque o governo prefere relicitar.

É o caso da CCR, na Nova Dutra, que liga Rio a São Paulo. A
concessão termina em 2021, mas a empresa defende obras na via, incluindo a
construção de uma nova subida da Serra das Araras para melhorar o trajeto que
tem quase um milhão de usuários diários. A empresa promete R$ 3,5 bilhões em
investimento, mas o governo diz que é preciso trocar o concessionário e
modernizar os contratos.

Gatilho. Nas concessões de segunda etapa, há temor em
relação à reação do Tribunal de Contas da União (TCU), que tem questionado as
obras liberadas pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT).
Realizadas no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, previu poucas obras e, em
troca, garantiu aos motoristas tarifas baixíssimas. Ficou célebre o pedágio de
R$ 0,99 que saiu vencedor na disputa pela Fernão Dias, que liga Minas Gerais a
São Paulo.

Os contratos, porém, preveem que quando o fluxo de veículos atinge
determinado volume, é possível fazer obras de ampliação, recebendo aportes do
governo ou ganhando permissão para elevar a tarifa. O dispositivo é conhecido
como “gatilho de investimento”.

Empresas dessa etapa têm R$ 12 bilhões engatilhados para
novas obras, mas não disparam R$ 1. “Enquanto o TCU não der ok à ANTT, nada
anda”, diz Cesar Borges, presidente da ABCR. As empresas também têm expectativa
em relação ao resultado da segunda revisão quinquenal dos contratos.

A situação é dramática na terceira etapa. Realizada no
governo de Dilma Rousseff, a meta era induzir o crescimento, abrindo rotas. As
empresas tinham de fazer duplicações mesmo sem demanda. Em troca, receberiam
crédito, com taxas de juros subsidiadas do BNDES.

O mercado diz que são as concessões da “tempestade
perfeita”, porque deu tudo errado. Afora o fato de o Brasil ter entrado na
recessão, vencedores do leilão eram ligados a construtoras investigadas na Lava
Jato. O BNDES cortou o crédito. Descontando parte do que foi feito, estima-se que
elas represem R$ 12, 5 bilhões em investimentos.

A Galvão Engenharia, que levou a BR-153, é o caso extremo.
Os acionistas foram presos, não recebeu um centavo do BNDES, não conseguiu nem
construir praças de pedágio, mas já gastou R$ 220 milhões só na manutenção da
estrada. “Podemos vender, devolver e até pedimos caducidade, mas qualquer
alternativa depende de definição legal que ainda não existe”, diz Paulo
Coutinho, presidente da concessionária. O governo organizou um grupo em busca
de solução para essas empresas, mas ainda não chegou a uma definição.

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