Em 15 de
dezembro de 2014 o trem de carga circulou pela última vez na Estação
Ferroviária do Amapá. No ano seguinte, foi a vez da ala de passageiros
paralisar os serviços. Desde esse período, os quase 194 quilômetros de linha,
que vai de Santana a Serra do Navio, passando por cinco localidades amapaenses,
vêm sendo saqueados e tendo áreas de domínio invadidas.
Um relatório
de 2017 da Secretaria de Estado de Transportes (Setrap) aponta que “o nível de
ocupação da faixa vem tomando proporções alarmantes nas proximidades do
município de Santana”. Mais de 1,3 mil invasões já haviam sido constatadas
ainda em 2013, e o relatório afirma que esse número pode ter triplicado nos
últimos anos, inclusive com construções muito próximas à linha ferroviária.
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
- SP nos Trilhos: os projetos ferroviários na carteira do estado
A Setrap
explica que os casos de invasões e saques de materiais são denunciados à
polícia, em especial as ocorrências nas áreas do pátio que fica em Santana, a
17 quilômetros de Macapá, de responsabilidade do governo. Outra medida é manter
vigilância 24 horas no local.
Mas, a
fiscalização é restrita ao pátio. Os 194 quilômetros de trilhos passam ainda
por áreas habitadas no município de Porto Grande, distrito de Cupixi, município
de Pedra Branca do Amapari, além de outras localidades menores, o que torna
difícil fiscalizar toda a extensão, alerta a Setrap.
Para
Lauromar Sabadine, chefe da Gerência de Transportes e Terminais Ferroviários
(GTDF) da Setrap, que trabalha com a Estrada de Ferro do Amapá desde 1981, o
abandono do patrimônio ocorreu a partir de problemas ocorridos após a posse da
mineradora Zamin, em 2013, que não implementou medidas de prevenção a furtos,
roubos e depredação na linha de ferro, provocando prejuízos ao Estado.
“O que está
havendo é um verdadeiro saque. A linha ferroviária vem sendo saqueada desde que
o porto quebrou há cinco anos. São inúmeros os saques do ferro dos trilhos, de
peças, de rodeiros de vagões e locomotivas”, relata.
O caso mais
recente foi registrado pela Setrap na última semana, quando uma carreta foi
vista com um carregamento de roda, eixo e outras estruturas de ferro
provenientes da linha ferroviária. O veículo foi visto indo em direção à balsa
do Rio Matapi, entre as cidades de Santana e Mazagão.
Sobre esse
caso, o gerente de transportes da Setrap, Andrey Rêgo, diz que foi feito
boletim de ocorrência, mas não se sabe de que ponto da estrada o material foi
retirado e nem quem são os responsáveis.
“A denúncia
está sendo apurada. A polícia investiga se, até 2016, quando a empresa tinha
posse da área, houve o sucateamento e retirada desse material e levado para
outros galpões, para que depois eles começassem a fazer a retirada para vender
para fora do estado. Mas posso garantir que os nossos fiscais foram até a área
de Santana, de responsabilidade do estado, e esse material não é daquela
região”, justificou.
Com a
paralisação das atividades de mineração, os mais de 380 vagões de carga, além
do trem de passageiros, sofrem com o abandono e estão espalhados por áreas onde
passa o trilho.
“Os ferros
do trem têm alto valor comercial. É material especial feito de aço e manganês.
Não é ferro qualquer. Os equipamentos estão sendo desmontados por quem entende,
porque são estruturas grandes e pesadas”, alertou Sabadine.
Em 2017, o
G1 mostrou o estado de abandono da estrutura montada pela Zamin em Santana.
Além do mato alto no entorno dos maquinários da ferrovia e demais estruturas,
no interior dos prédios há vandalismo. Janelas e portas foram arrombadas e
levadas, documentos foram danificados e pelo menos 80 notebooks foram deixados
pela empresa.
O caso é
resultado do drama financeiro que a empresa passou a viver após o desabamento
do porto particular para exportar manganês, em 2013.
A mineradora
tenta evitar a falência num processo de recuperação judicial onze anos depois
da primeira exportação, feita em 2007, ainda sob a administração do
ex-bilionário Eike Batista. A dívida envolve 321 credores e chega a R$ 1,5
bilhão.
Por causa do
ostracismo provocado pelas empresas, a mineração sofreu a primeira intervenção
em julho de 2015, quando o governo do Estado decretou a perda da ferrovia
concedida à Zamin. O caso foi parar na Justiça, que manteve a caducidade da
concessão.
EFA
A Estrada de
Ferro do Amapá era de propriedade da Indústria e Comércio de Minérios S.A
(Icomi), que mantinha com a União uma concessão que durou dos anos 50 até 1998.
A linha foi construída em menos de 4 anos, de 1954 a 1957. Após o fim da
concessão, todos os bens reversíveis foram transferidos ao Estado do Amapá.
De 1998 a
2006, para evitar o transporte de passageiros, o governo contratou uma empresa,
como permissionária, até que houvesse licitação para o Contrato de Concessão de
Exploração de Serviço Público do Transporte Ferroviário de Carga e Passageiros,
o que ocorreu em 2006, tendo como ganhadora a MMX. Em 2008 a concessão foi
transferida para a Anglo American e, em 2013, para a Zamin.
Seja o primeiro a comentar