Dependente do governo para tirar projetos do papel, Doria evita confronto agressivo com Bolsonaro

Um dos alvos preferenciais dos ataques do presidente Jair Bolsonaro nas últimas semanas, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), tem evitado um confronto mais agressivo para não antecipar uma possível disputa eleitoral em 2022, mas também por outro motivo ligado à sua administração: Doria depende do governo federal para tirar do papel projetos prioritários do seu plano de desestatização.

Numa lista de 21 itens escolhidos no início do ano para serem entregues à iniciativa privada, três são apontados como menina dos olhos do governador. São o porto de São Sebastião, a nova Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp) e o Trem Intercidades (TIC). Todos envolvem patrimônio federal e foram tema da primeira reunião entre o governador e o presidente, em Brasília, em janeiro.

Com os cofres federais na penúria, o repasse de recursos da União tem ficado abaixo do previsto. Por isso, a gestão Doria considera as concessões o assunto de maior interesse do estado com o governo federal hoje.

– São Paulo está sofrendo o que todos os outros estados estão. O governo federal está sem recursos para investir – explica o vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, numa entrevista semana passada.

O pacote de privatizações e concessões é vitrine da gestão Doria e apontado como cartão de visitas de sua possível candidatura à Presidência. Com ele, o governador promete reduzir o tamanho do Estado, aliviar as contas públicas e entregar serviços mais modernos à população.

O tempo do governo

Mas, por se tratar de ativos federais, Doria precisa de aval de Bolsonaro para que as concessões da Ceagesp, do porto e do trem virem realidade. A última posição que o governo teve sobre esses projetos é que estão tramitando normalmente pelos gabinetes da equipe de Bolsonaro, e o acirramento do embate político entre os dois nas últimas semanas não contaminou, até o momento, a pauta administrativa.

– Estive no Palácio do Planalto e não vi impacto prático dessas questões políticas nas ações de governo. Não acredito que o presidente Bolsonaro tomará qualquer atitude contra São Paulo. É o principal estado do país, e fazer isso seria se voltar contra a população – diz o chefe do escritório de Representação do Estado de São Paulo em Brasília, Antonio Imbassahy.

Os arroubos de Bolsonaro contra Doria colocaram, entretanto, a equipe do governador em alerta. Há apreensão com prazos, pois concessões são processos burocráticos. A promessa de Doria é entregar o plano de desestatização até 2022.

Auxiliares do governador disseram na semana passada que consideram pouco provável que Bolsonaro interrompa a tramitação dos pedidos de Doria, mas não foi descartado que ela demore mais do que levaria quando a relação entre eles era de proximidade. No caso da Ceagesp, o governador afirmou que o projeto seria implementado em 2021, mas a Secretaria da Agricultura informou ao GLOBO na sexta-feira não ser possível estimar datas.

Doria e Bolsonaro têm planos de disputar a eleição presidencial de 2022 como adversários. Na eleição de 2018, o tucano se elegeu com o voto Bolsodoria em São Paulo e, no início do governo, mostrava influência e intimidade com o aliado.

Desde meados de agosto, o cenário mudou. Bolsonaro começou a fazer ataques públicos ao tucano, a quem já acusou de ser “amigão” do ex-presidente Lula, de estar “morto” na eleição de 2022 e sofrer de “ejaculação precoce” na política.

No caso da Ceagesp, o equivalente ao Ceasa no Rio, Doria pediu a Bolsonaro que o entreposto seja estadualizado. Ele prometeu, na campanha, trocar a central de abastecimento de endereço e, no terreno atual, construir um polo tecnológico, apelidado de Vale do Silício paulista.

Para viabilizar o Trem Intercidades, o primeiro de média velocidade do país e que ligaria a capital aos municípios de Campinas e Americana, Doria precisa de autorização para usar uma ferrovia federal que está concedida à iniciativa privada. O tucano quer compartilhar os trilhos para fazer uma PPP. O caso está em análise no Ministério da Infraestrutura.

O caso do porto de São Sebastião, no litoral norte paulista, também está com a pasta da Infraestrutura. Doria está esperando que o governo federal reassuma o porto, que é gerido pelo estado há anos, e conduza a concessão. Além do impacto econômico positivo que traria para a receita da administração estadual, a entrega do ativo à União aliviaria os cofres estaduais. Em 2019, a previsão é gastar R$ 6,8 milhões com operação e manutenção do porto.

Fonte: https://oglobo.globo.com/brasil/dependente-do-governo-para-tirar-projetos-do-papel-doria-evita-confronto-agressivo-com-bolsonaro-23934557

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