Banco asiático vê Brasil como ‘chave’ para as Américas

Foto: Divulgação

O Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura (BAII), que tem a China como seu maior acionista, vai começar abrir seus cofres para financiar projetos no Brasil. Energia limpa, logística e infraestrutura digital são algumas das áreas prioritárias para instituição, que foi criada há apenas quatro anos e tem um capital de US$ 100 bilhões.

Na semana passada, o Senado aprovou a adesão do Brasil à instituição, passo decisivo para que o banco comece a atuar aqui.

Em sua primeira entrevista desde que assumiu o cargo em março, o novo diretor-geral do Departamento de Operações e principal contato da instituição com o Brasil, Alberto Ninio disse que o país é visto como chave nas Américas.

O Brasil é o maior país da América Latina e tem uma importância estratégica de representatividade nas Américas como um todo, até porque esse é um banco que não tem os Estados Unidos como um de seus membros, afirmou ele ao Valor.

O BAII foi fundado sob a perspectiva de desempenhar um papel de banco multilateral com ênfase na Ásia tão relevante quanto o papel que o Banco Mundial tem desempenhado por anos no Ocidente.

Nas Américas, o Canadá é um dos países-membros do novo banco, mas não está entre os elegíveis para receber em empréstimos. Os Estados Unidos não participam do banco.

O volume de recursos que poderá ser transferido para projetos no Brasil nos próximos anos ainda é algo a ser definido, segundo Ninio.

A gente ainda precisa ter uma primeira conversa com o governo brasileiro e já houve uma manifestação de interesse em conversar conosco nas próximas semanas, inclusive também com alguns bancos estaduais de fomento, afirmou Ninio de Pequim, onde o banco tem sua sede. Mas não existe ainda um número [um montante definido de empréstimo a ser concedido a projetos no Brasil].

O banco tem um capital bastante robusto na casa de US$ 100 bilhões e tem um foco com aquilo que tem conectividade com a Ásia, disse.

Em meados de julho, a cúpula do BAII aprovou US$ 19,6 bilhões para 87 projetos e 24 países. Hoje, os cinco maiores mercados do BAII são a Índia, com créditos de US$ 4,35 bilhões para 17 projetos; Turquia, com US$ 1,95 bilhão para sete projetos; Indonésia, com US$ 1,94 bilhão em também sete projetos; Bangladesh, com US$ 1,6 bilhão em seis projetos; e Paquistão, com US$ 1,26 bilhão em seis projetos.

Entre os projetos que se encaixam no cardápio do banco asiático, estão aqueles tradicionais de infraestrutura, como estradas, ferrovias e portos.

Estão também projetos de energia solar e ainda projetos no front digital ligados a telecomunicações de última geração e de inteligência artificial, diz o executivo brasileiro.

O banco busca contratos com o poder público ou com empresas privadas. A prioridade é que sejam projetos que tenham conexão com países da Ásia. No caso do Brasil, podem ser melhoria de portos por onde são escoados grãos do Centro-Oeste para clientes asiáticos, por exemplo, ou soluções tecnológicas que liguem os dois mercados.

Tem uma série de áreas novas por meio das quais se pode conectar as duas regiões, diz Ninio, que fez carreira no Banco Mundial, onde passou 22 anos.

O BAII tem como lema ser clean (tolerância zero à corrupção), lean (enxuto, são hoje 350 funcionários e o máximo a atingir são 500; ante cerca de 17 mil do Banco Mundial) e green (com atenção a projetos que levem em conta as mudanças climáticas).

O banco asiático tem a Alemanha, a França e Canadá entre seus diversos membros, mas é a China a principal participante, com uma fatia de 26% de seu capital.

O Brasil manifestou interesse em tornar-se membro da instituição ainda em 2015 (um ano antes de ela ser efetivamente fundada), durante o governo da então presidente Dilma Rousseff (PT). Mas apenas agora, cinco anos depois, o Congresso aprovou a entrada do país no banco.

A aprovação ocorre num momento em que os EUA travam uma disputa econômica aguerrida com a China e num momento em que o Brasil, sob o governo Jair Bolsonaro, mantém um franco alinhamento político e deológico com o governo de Donald Trump. Mais do que isso: integrantes do círculo próximo de Bolsonaro colecionam nos últimos meses declarações antipáticas a Pequim.

Alberto Ninio diz que nada disso deve ser visto como obstáculo para futuros negócios do banco no Brasil.

Eu não vejo isso com qualquer óbice. Somos uma organização multilateral, uma organização internacional baseada, sim, na China, mas temos mais de cem países-membros e acho que é interesse dos seus membros colaborar com o Brasil e eventuais diferenças políticas que possam acontecer não podem prejudicar a missão do banco, afirmou o executivo.

O Itamaraty informou que aportará US$ 5 milhões da aquisição de ações do novo banco. A expectativa inicial era de uma aquisição de US$ 3,18 bilhões. O relator do projeto de adesão, o senador Jean Paul Prates (PT-RN), notou que até o pequeno arquipélago mediterrâneo de Malta aportou mais (US$ 172 milhões) no BAII que o Brasil.

Na prática, isso de não terá prejuízo no volume de recursos que poderão ser aportados em projetos no Brasil, diz Alberto Ninio. A implicação é puramente na governança do banco, no poder de voto. Não há correlação com o montante de crédito.

O BAII é o último banco multilateral criado em anos recentes. Antes foi o New Development Bank (NDB), apelidado de banco do Brics, com sede em Xangai e do qual o Brasil também é membro.

Fonte: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/08/14/banco-asiatico-ve-brasil-como-chave-para-as-americas.ghtml

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