Com a pandemia do novo coronavírus, as cidades experimentaram um movimento de pessoas voltando a usar os carros, o que causa congestionamentos, e de redução de passageiros no transporte público, seja pelo uso de veículos individuais ou pelo home office, trazendo impactos financeiros para o serviço. As alternativas para reduzir os engarrafamentos e garantir o funcionamento do transporte público com preço acessível foram debatidas na tarde desta quarta-feira, 12, no Summit Mobilidade 2020, evento promovido pelo Estadão.
Fala-se em cidades policêntricas, com os serviços perto da casa dos cidadãos. É possível aplicar tecnologias de semáforos e fazer a integração dos modais para conseguir atender a primeira e a última milha, integrando o transporte urbano para que o cidadão não tenha de usar o carro. Também tem aplicativo, bicicletas e patinetes, exemplifica Silvani Alves Pereira, diretor-presidente da Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô). Segundo Pereira, em 30 dias, o Metrô vai iniciar um teste com um aplicativo que vai permitir que o usuário escolha os melhores horários e quais modais podem ser usados para realizar o trajeto em menor tempo.
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
- SP nos Trilhos: os projetos ferroviários na carteira do estado
Durante o evento, a tecnologia foi apresentada como uma aliada para diminuir o trânsito nas cidades, mas soluções já conhecidas, como a implantação de ciclovias e a integração entre os modais, também foram citadas como meios de fazer com que as pessoas passem menos tempo em deslocamento e possam ter mais qualidade de vida.
A possibilidade de ter semáforos inteligentes nas cidades, tecnologia que já está sendo utilizada no País, foi um dos exemplos mostrados. A gente não entendia por que não havia algo que soubesse o que está ocorrendo no trânsito. Os semáforos ainda estão muito passivos e não são compatíveis com nossas necessidades, como melhorar a segurança para não ficar preso em um cruzamento à noite. Eles têm de coletar informações em tempo real. Hoje, é possível implementar uma tecnologia barata para tomar uma decisão como abrir ou fechar um cruzamento, explica Aleksandro Montanha, CEO da Seebot.
Transporte sob demanda e serviços de carona ganham força
Transporte sob demanda e serviços de carona, opções que já eram debatidas antes da pandemia, foram discutidas como alternativas para o agora e para o futuro. Neste momento, as pessoas estão fazendo trabalho remoto e muitas empresas vão ter políticas flexíveis para trabalhar de casa até que se tenha vacina, mas estamos trabalhando com empresas de serviços essenciais e vamos anunciar parceria com dois grandes hospitais de São Paulo em breve. Quanto menos aglomeração melhor. Então, a gente faz a parceria para que as pessoas tenham a opção de fazer a carona com o colega de trabalho, porque traz segurança, diz Douglas Tokuno, head de Waze Carpool para América Latina.
Professor associado do Mestrado e Doutorado em Administração Pública e Governo da FGV e pesquisador principal do CEPESP/FGV, Ciro Biderman destaca a importância das tecnologias, mas pondera que é preciso pensar que nem todas as pessoas têm acesso a elas. As inovações tecnológicas têm efeito significantes, mas, por si só, não vão resolver o problema. Os brasileiros têm smartphones, mas quantos têm espaço para baixar aplicativos? Quantos têm (pacote de) dados para fazer isso?, questiona.
Prefeito de Porto Alegre defende cobrar tarafia de transporte individual para reduzir tarifa de ônibus O valor das passagens e medidas mais conhecidas que podem ser implementadas nas cidades também foram debatidos por especialistas e prefeitos que participaram do evento. Nelson Marchezan Júnior (PSDB), prefeito de Porto Alegre, defendeu a cobrança de tarifas para usuários de transporte individual, que seria revertida para reduzir o valor da tarifa de ônibus.
O problema central é que o Brasil não vê como um problema nacional a questão do transporte coletivo, porque é responsabilidade do município. Mas a atenção básica é do município, porém, tem uma política nacional. Na área social, ninguém imagina que a própria pessoa vai pagar a assistência social. No transporte, o Brasil aceita que o usuário pague. O veículo individual privado tem de pagar o transporte público. Estamos tirando uma taxa de 3% e tentando colocar no aplicativo para subsidiar o ônibus e implantar uma taxa de congestionamento onde tem um atrativo, um valor de meia passagem de pedágio que vai diminuir o valor da passagem (de ônibus) para o usuário.
O investimento em ciclovias e reformas de calçadas foi uma das prioridades de seu segundo mandato, afirmou Teresa Surita (MDB), prefeita de Boa Vista. Trabalhamos com a primeira infância e em parceria com entidades internacionais. A gente vê a cidade de 95 cm, que é a altura de uma criança de 3 anos e de uma pessoa de cadeira de rodas. Então, trabalhamos acessibilidade e calçadas. Em 2016, a cidade não tinha ciclovia e, agora, temos 42 km. A visão sempre foi de muito conforto e segurança tanto para os que praticam esportes quanto para o trabalho.
O investimento em mobilidade urbana é fundamental e a pandemia tem mostrado quais os principais desafios que devem ser enfrentados, avalia Marcos de Sousa, editor e coordenador de campanhas do Mobilize Brasil. É um momento de desafio, mas que exige uma política para repensar a mobilidade urbana, melhorando a mobilidade ativa, a pé e bicicleta, tributando o transporte individual e quem ocupa a cidade com seus veículos grandes, poluidores e ruidosos, porque o Brasil continua com tarifas muito altas se comparadas com a renda das pessoas.
E a população deve ficar atenta aos seus direitos e cobrá-los, segundo Preto Zezé, presidente global da Central Única das Favelas (CUFA). Temos baixo engajamento social para a defesa de uma agenda pública da sociedade, que foi capturada por interesses políticos. O grande desafio que a covid jogou na cara é que tem um monte de desigualdade e injustiça. Temos de ver como democratizar a participação do usuário, que está pagando pelo serviço na hora e é alguém que mobiliza uma economia que mantém uma empresa. Há desigualdades porque as pessoas pensam na cidade a partir da Europa e não pensando nos locais invisíveis onde só a polícia chega.
Seja o primeiro a comentar