Valor Econômico – Na última década, não só o Brasil tornou-se o maior produtor e exportador de soja do mundo como o grão se estabeleceu de vez como o produto que mais gera riqueza no agronegócio nacional. Uma pesquisa elaborada pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, em parceria com a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), deixa claro esse crescente protagonismo: no ano passado, o produto interno bruto (PIB) da cadeia produtiva de soja e biodiesel chegou a R$ 673,7 bilhões, o equivalente a 27% do PIB total do agro brasileiro. Em 2010, a fatia era de 9%.
“Foram meses de trabalho para levantarmos os dados. Posso dizer, com segurança, que esse é o segmento que lidera o ranking das cadeias agropecuárias do Brasil”, disse Nicole Rennó, pesquisadora do Cepea e uma das responsáveis pela pesquisa. Entre 2010 e 2022, a participação da soja na geração de riqueza da economia brasileira passou de 2% para 7%.
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O Brasil assumiu a liderança do ranking mundial de exportações do grão na safra 2012/13. Agora, apenas uma década depois, o país deverá responder por mais da metade do comércio global da oleaginosa – a fatia será de 55% em 2022/23, segundo as projeções do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA).
A liderança na produção é ainda mais recente: a colheita brasileira ultrapassou a americana em 2019/20. O avanço tem correlação direta com o forte aumento de produtividade das lavouras nacionais ao longo desse período, afirma Daniel Amaral, economista-chefe da Abiove.
Segundo ele, a participação da cadeia de soja e biodiesel poderia ser até maior que a atual, de 27%, se não fosse pela estiagem de 2021/22, que levou a uma perda de 20 milhões de toneladas na colheita. Com a quebra de safra no Centro-Sul do país, o PIB da soja in natura caiu 18% no ano passado, de acordo com os cálculos de Abiove e Cepea.
No ano passado, o segmento de agrosserviços respondeu pela maior fatia do PIB da cadeia do grão, com R$ 362,5 bilhões, o que representou um crescimento de 51% em relação a 2010. No mesmo intervalo, a riqueza gerada pela soja aumentou 53%, para R$ 192,1 bilhões, a da agroindústria, 46%, para R$ 77 bilhões, e a dos insumos, 109%, para R$ 42,1 bilhões.
Na avaliação de Guilherme Bellotti, gerente da consultoria Agro do Itaú BBA, os números do estudo sugerem uma perspectiva favorável para os próximos anos. “O cenário é positivo para o setor, na esteira crescente da demanda por alimentos e também do aumento da produção global de biocombustíveis, uma vez que temos uma tendência de ‘esverdeamento’ da matriz de combustíveis líquidos”, destaca ele.
“O número de trabalhadores na área surpreendeu” — Nicole Rennó
A cadeia de soja e biodiesel gerou 2,05 milhões de postos de trabalho no Brasil no ano passado, número levemente superior ao de 2021, quando foram 2,03 milhões, e 80% maior que o de 2012. Para o cálculo, o estudo considerou a população que atua com e sem carteira assinada, profissionais que trabalham por conta própria, empregadores e trabalhador familiar auxiliar. A maior parte dos profissionais está no setor de agrosserviços, com 1,35 milhão de empregos, ou 70,5% a mais do que dez anos antes.
A participação da cadeia produtiva da soja na geração de vagas de trabalho no agronegócio, que era de 5,8% em 2012, passou a 10,8% no ano passado. Em comparação com a população ocupada total do país, a participação da cadeia da oleaginosa passou de 1,3% para 2,1% no mesmo período.
“O número de trabalhadores na área surpreendeu, já que a soja não é conhecida como uma grande empregadora”, diz a pesquisadora Nicole Rennó. “Essa é uma cadeia avançada em termos de modernização. Mas, ao crescer de maneira acelerada nos últimos anos, o segmento acabou aumentando também a oferta de vagas”.
O rendimento médio dos trabalhadores que atuam no segmento de soja e biodiesel era de R$ 2.912 mensais no fim do ano passado. O montante é 29% superior à média geral do agronegócio, de R$ 2.257 por mês, de acordo com o estudo.
Para o economista Daniel Amaral, da Abiove, o crescimento da participação da cadeia de soja e biodiesel no PIB do agronegócio entre 2010 e 2022 não significa necessariamente que outros segmentos do agro estão perdendo receita. “O PIB do agro cresceu, assim como a economia nacional nos últimos anos, ainda que não na mesma proporção da cadeia da soja. Mesmo assim, quando se tem uma atividade que gera empregos diretos e indiretos, a renda cresce, e essa renda será consumida em outros setores de bens e serviços, por exemplo. É uma expansão que se estende para outras cadeias produtivas, sejam agroindústrias ou não”, afirma.
As exportações do complexo soja mantiveram-se em rota ascendente entre 2010 e 2022, ainda que tenham ocorrido algumas quedas ocasionais ao longo desse intervalo. No ano passado, a receita com os embarques atingiu um novo recorde, chegando a US$ 61,3 bilhões. O montante representou 38% das vendas do agronegócio ao mercado externo.
A soja in natura foi responsável por 76% da movimentação financeira das exportações entre 2010 e 2022. O farelo respondeu por 19,1%, e o óleo de soja, por 4,5%.
A China é, por larga margem, o maior destino da soja brasileira: desde 2013, os chineses são responsáveis por mais da metade da receita do Brasil com os embarques do grão (a fatia foi de 52,6% em 2022). Ainda assim, a fatia chinesa tem caído desde 2019, já que outros mercados do Sudeste Asiático, África e Oriente Médio têm aumentado suas importações.
Solavanco
A estiagem que ocorreu no Centro-Sul do país na temporada 2021/22 e levou a uma quebra de 20 milhões de toneladas na colheita nacional da oleaginosa, em particular no Rio Grande do Sul, reduziu levemente a participação da cadeia da soja no PIB geral do agronegócio brasileiro. Em 2021, o segmento respondeu por 29% da geração de riquezas do campo, um recorde histórico, mas, no ano passado, a fatia caiu para 27%. Isso não ofusca a expressiva expansão do domínio da oleaginosa sobre o produto interno bruto do agronegócio. O intervalo entre os anos de 2010 e 2022 “foi marcado pela forte aceleração da expansão da área e da produção de soja no país e por um desempenho das indústrias de esmagamento e refino, de biodiesel e de rações acima do desempenho médio da agroindústria nacional”, destacam Cepea e Abiove no estudo.
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