Agência Infra – A reunião convocada pela CVT (Comissão de Viação e Transportes) da Câmara dos Deputados para discutir a concentração das operações de ferrovias no Brasil foi marcada por duras críticas de usuários aos elevados custos, falta de atendimento, baixa transparência de informações e demora nos investimentos no setor por parte das concessionárias de ferrovias devido ao monopólio das operações. O encontro desta quarta-feira (11) pode ser visto neste link.
O presidente da comissão, deputado Gilberto Abramo (REP-MG) chegou a falar em CPI sobre o tema diante dos relatos dos representantes da Anut (Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga) e da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) sobre os problemas enfrentados pelos usuários e o temor dito por eles de que sejam feitas retaliações em casos de denúncia.
O representante da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários), Yuri Pontual, e de uma das concessionárias, a Vale, Pedro Franco, não chegaram a responder diretamente aos questionamentos apresentados pelos usuários sobre esses temas. Lembraram que as empresas estão investindo desde a privatização para melhorar a operação e ampliar o volume transportado, o que se concretizou; que houve diversificação de cargas transportadas em todas as malhas e ampliação de clientes atendidos; e que haverá recorde de investimentos nos próximos anos, sendo necessária estabilidade na regulação para isso.
O secretário nacional de Ferrovias do Ministério dos Transportes, Leonardo Ribeiro, e o diretor-geral da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), Rafael Vitale, tentaram explicar a complexidade da regulação do setor, que tem características naturais de monopólio, e apresentar ideias do plano que o governo pretende implementar neste ano para endereçar os problemas informados pelos usuários.
“Entendo que, se de um lado há tendência para o monopólio, que é uma falha de mercado, natural, pelas características do mercado, ao mesmo tempo temos instrumentos de política pública para balancear isso. E o privado e o público caminham juntos no sentido das ferrovias ocuparem um espaço maior no orçamento e na matriz de transportes”, disse Ribeiro.
Luiz Baldez, da Anut, e Alexandre Barra, da Abiove, informaram que as concessionárias estão ampliando cada vez mais as cobranças das operações acessórias (que têm preços livres) e que em alguns casos elas já representam mais de 60% do custo total de um transporte. E voltaram a reclamar que os preços ferroviários acabam ficando de “6% a 7% abaixo do frete rodoviário”, quando poderiam ser muito menores.
Segundo Barra, tem sido cada vez mais comum as empresas do setor receberem negativa de atendimento por falta de capacidade alegada pelas concessionárias, especialmente nas chamadas operações spot (sem contrato de longo prazo). Ele explicou que, no caso do setor agrícola, por problemas de safra, nem sempre é possível garantir todo o volume em contratos de logo prazo (chamados take or pay).
Barra reclamou que não há informações públicas seguras para garantir que as empresas, de fato, não têm espaço para transportar. Ambos relataram dificuldades no funcionamento das comissões tripartite (que reúnem representantes de empresas, usuários e agência).
Abusos nas tarifas acessórias
O diretor-geral da ANTT, Rafael Vitale, afirmou que a agência está planejando regulamentar as operações acessórias e passar a avaliar se há abusividade em cobranças que passarem de 24% do valor da tarifa de transporte, que tem preço-teto. Ele garantiu, no entanto, que a agência tem dados sobre as operações e também pediu para que os usuários apresentem informações sobre os custos serem próximos dos fretes ferroviários.
Os representantes dos usuários sugeriram que a agência deve seguir no modelo de implantar um centro de controle (chamado de CNSO) para visualizar as operações das concessionárias e assim tentar evitar abusos, o que Vitale disse que está em implementação na agência para este ano ou até o próximo.
Em sua fala, Vitale afirmou ainda que tanto concessionárias como usuários estavam apresentando informações verdadeiras sobre o tema ferroviário, que é o de maior complexidade dentro da agência, e que é preciso ampliar o diálogo para que se possa corrigir os problemas e avançar com os investimentos ao mesmo tempo.
“As reuniões que vamos fazer precisam responder se são as concessionárias que criam barreiras ou impedem. Ou se são condições mínimas que os usuários precisam se dispor a enfrentar para que aconteça. Não é simples. Qualquer investimento adicional precisa estar atrelado a um contrato take or pay para que haja segurança. Mas isso está claro para os usuários? Precisam de algo mais? Aí é onde vamos avançar”, disse Vitale.
Intervenção desproporcional
O diretor-geral da agência explicou ainda que uma política pública pode impor determinadas condições para a operação, como obrigar a ter um trem de algum tipo, mas que isso implica custos para outros tipos de carga.
“Pediria que os desejos sejam feitos com cautela para que não seja imposta uma intervenção desproporcional do Estado, que pode ter efeitos colaterais. Eu falo com os usuários: cuidado com o que desejam porque pode ser pior. E para as concessionárias eu falo sempre que no fim das contas a concessão é um serviço público que tem que atender à sociedade”, disse o diretor-geral.
Consulta pública este ano
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O secretário nacional de Ferrovias do Ministério dos Transportes, Leonardo Ribeiro, afirmou durante a audiência pública na CVT da Câmara dos Deputados que ainda neste ano será aberta uma consulta pública para que toda a sociedade possa avaliar a proposta de uma portaria para regulamentar as operações ferroviárias no país.
Segundo ele, a portaria é parte de um conjunto de ações para aumentar os investimentos e ampliar a participação das ferrovias no volume de cargas transportado. Algumas ações já estão executadas ou em execução, disse o secretário, citando a Portaria 532 do ministério, com novas diretrizes para a renovação das concessões ferroviárias.
E também a consulta pública em andamento na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), que pretende criar norma para a devolução de trechos não operados pelas concessionárias, que podem resultar na realização de chamamentos públicos para novos operadores, o que deve estar concluído no próximo mês.
Sobre a portaria para regulamentação das operações, Leonardo falou que haverá uma nova política para assegurar a interoperabilidade dos trens na movimentação de cargas e de passageiros no país.
Novas concessões
Em relação aos novos projetos de concessão ferroviária que o governo está avaliando apresentar, o secretário informou que os da Ferrogrão, EF-118 (Rio de Janeiro-Espírito Santo) e Corredor Fico-Fiol (ferrovias de Integração Centro-Oeste e Oeste-Leste) vão ser lançados para licitação.
Já em relação ao corredor Minas-Bahia, hoje operado pela FCA (Ferrovia Centro-Atlântica), Ribeiro afirmou que o governo discute se faz um leilão específico ou se coloca os investimentos no projeto de renovação antecipada da FCA, que está em audiência pública no momento.
Ribeiro também garantiu que até março de 2025 concluirá os estudos para a licitação da ferrovia de passageiros entre Brasília (DF) e Luziânia (GO). Haverá um decreto para criar uma Política Nacional de Transporte de Passageiros no país. Ele defendeu que é necessário também fazer os estudos para poder licitar as concessões.
“O grande legado da gestão vai ser uma carteira inédita de Evteas [Estudos de Viabilidade]. Demos diretriz para que a Infra S.A. estude toda a malha ferroviária (…) para licitar novas ferrovias”, disse Leonardo Ribeiro.
PPPs de aporte
Leonardo Ribeiro também defendeu o modelo de licitação que o governo vai apresentar, com PPPs (Parcerias Público-Privadas) com aporte inicial, como melhor do que o modelo de investimentos cruzados com obras feitas diretamente pelo concessionário, usado na gestão anterior.
Segundo ele, o ministério segue em conversas com a Fazenda para viabilizar uma forma de utilização dos recursos das outorgas de ferrovias, seja com os recursos do Orçamento da União de forma garantida ou por repasse direto das concessionárias para as PPPs que forem licitadas.
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