Mudança ‘leve’ em marco das concessões pode destravar investimentos

Valor Econômico – A atualização do marco legal das concessões (Lei 8.987/95), que completou 30 anos em fevereiro, deve ter debate e votação retomados no Congresso na primeira quinzena de abril. A previsão é do relator do projeto de lei (PL) na Câmara dos Deputados, Arnaldo Jardim (Cidadania-SP).

O parlamentar está concluindo a rodada de consulta aos especialistas e às entidades do setor para fechar seu parecer, a ser apresentado na reunião de líderes partidários na segunda semana de abril. A proposta pega carona no PL 7.063/2017, que passou por debate em comissão especial.

Ao Valor Jardim informou que, depois de apresentar o relatório aos líderes da Casa, levará o texto à votação em plenário. O projeto tramita em regime de urgência. O deputado foi designado relator pelo então presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decisão que foi mantida por seu sucessor, Hugo Motta (Republicanos-PB).

Com a expectativa de destravar investimentos, tanto Motta como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já sinalizaram que a atualização da lei é pauta prioritária. O PL propõe mudanças também na Lei 11.079/04, sobre parceria público-privada (PPP).

Procurado, o Ministério da Fazenda reiterou seu entendimento sobre a mudança na legislação. “Trata-se de uma agenda prioritária para o ministério, que contribui para reduzir incertezas e aumentar a confiança de investidores e operadores do setor, gerar empregos e melhorar a prestação de serviços públicos à população.”

A Fazenda defende que essa atualização é “fundamental para modernizar o ambiente regulatório e dar maior segurança jurídica aos investimentos em infraestrutura no Brasil”. De acordo com a pasta, o projeto de lei propõe “aperfeiçoamentos relevantes como regras mais claras para repartição de riscos, alternativas para solução consensual de conflitos, maior autonomia na gestão de receitas e mecanismos que garantem o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos”.

Atualmente, o relator tem definidos 21 pontos de aperfeiçoamento, sendo 18 da Lei das Concessões e outros três da Lei de PPPs. A proposta é acompanhada com atenção por especialistas do setor, preocupados com eventuais inovações que possam gerar insegurança jurídica e incertezas que afetem investidores.

“Não precisamos de mudanças estruturais na lei, porque muito da segurança jurídica que temos no setor de infraestrutura decorre dos consensos interpretativos formados historicamente a partir de sua aplicação aos casos concretos”, disse, ao Valor, o advogado Fernando Vernalha, sócio-fundador do Vernalha Pereira.

Vernalha, por outro lado, reconhece que algumas atualizações precisam ser feitas. Para ele, trata-se de mudanças que vão respaldar as “novas práticas” que se desenvolveram nas últimas décadas, mas sem respaldo na legislação.

Especialistas ouvidos pelo Valor avaliam que isso tem feito governos e concessionárias enfrentarem longos processos, com idas e vindas aos órgãos de controle, por falta de clareza na lei sobre temas espinhosos, como resolução de conflitos, reequilíbrio de contratos, transferência da titularidade, intervenção e recuperação judicial da concessão.

O também advogado e especialista em concessões Maurício Portugal Ribeiro reforça a necessidade de fazer apenas ajustes pontuais e “cirúrgicos” na lei. Nos debates, defende que “lei boa é lei velha”, que é capaz de conferir maior previsibilidade aos investidores do setor de infraestrutura.

Sócios de Infraestrutura e Energia do escritório Mattos Filho, André Luiz Freire e Marina Anselmo defendem que algumas mudanças demoraram para acontecer. Freire cita a criação de mecanismo de extinção de contratos por “inadimplemento” do poder público – quando o governo não honra compromissos financeiros, por exemplo.

“Hoje, o agente privado nessa condição não tem medida alguma para recorrer. Ou entra num acordo no qual abre mão de muita coisa ou tem que ir para o Judiciário, tendo que esperar o trânsito em julgado que leva mais de dez anos”, disse Freire.

Marina defende que é preciso disciplinar, mas não acabar com a recuperação judicial para concessionárias públicas. Segundo ela, a iniciativa de vedar a recuperação parte de percepção ruim sobre casos isolados, no qual o investidor privado usou o processo judicial para, por exemplo, se livrar do pagamento de outorgas.

Marcos Perez, advogado da Manesco Advogados, classifica o marco de concessões como “anacrônico”, por ter sido elaborado para modelos de contratos da década de 1930. Ele ressalta, porém, que a lei tem a grande vantagem de ser “simples” e não engessar o setor, e que esse aspecto deve ser considerado na proposta discutida.

Fonte: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/03/31/mudanca-leve-em-marco-das-concessoes-pode-destravar-investimentos.ghtml

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*



0