Valor Econômico – A mineração é um dos setores mais importantes na pauta de exportações brasileira. Em 2024, segundo dados do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), as vendas do setor somaram US$ 43,4 bilhões e responderam por 47% do saldo da balança comercial do país. O minério de ferro é o principal item dessa pauta, e a China é o principal destino das exportações, absorvendo 71% do total.
Só no ano passado, os embarques de minério de ferro brasileiro para o mercado chinês cresceram 6,3%, atingindo 276,6 milhões de toneladas. Isso representa quase 70% do volume das vendas globais do país, considerando todos os tipos de minério exportados. E a perspectiva para 2025 é de mais um ano de crescimento nos volumes. Mas, apesar da alta, as vendas de ferro do Brasil para a China aumentaram apenas 1% em dólar.
Isso acontece apesar da crise no mercado imobiliário chinês, um dos principais impulsionadores para a demanda do mercado global de minério de ferro. Patrícia Seoane, líder da PwC Brasil para a indústria de mineração, observa que a demanda do mercado de construção na China teve queda no primeiro trimestre do ano, assim como o consumo de aço. Patrícia explica que a cotação do minério de ferro vem em baixa desde o ano passado. “Alguns traders da China têm aproveitado esse momento para refazer os estoques.”
Segundo a Vale, maior exportadora de minério do Brasil, a China passa por uma grande mudança em seu modelo, que antes era baseado no mercado imobiliário, e agora está mais focado em consumo e manufatura. “Percebemos um momento econômico bem mais positivo, com estímulo ao consumo, e as ações do governo estão sendo muito concretas. Vemos que há uma demanda sólida na China para os nossos produtos”, informou a empresa, em nota.
De acordo com a companhia, houve redução da dependência de minério de ferro do mercado imobiliário de 40% para 30%. Por outro lado, a Vale projeta que a produção chinesa de aço tende a se manter acima de 1 bilhão de toneladas.
A empresa considera que o setor de infraestrutura na China “continua forte e o de manufatura também acelerou, com linha branca, veículos elétricos”. Além disso, a Vale aponta que os projetos chineses de descarbonização seguem firmes, o que demanda muito minério de alta qualidade.
Enquanto isso, a China segue sendo o principal mercado da Vale, com uma participação de 61% na receita, considerando apenas os negócios referentes ao minério de ferro. Para continuar crescendo no mercado chinês, a mineradora brasileira aposta em novos modelos de negócio, como os mega hubs voltados para a produção de aço de baixo carbono como hidrogênio verde, e em produtos inovadores, como o briquete de minério de ferro desenvolvido para a indústria siderúrgica. Segundo a companhia, o produto pode reduzir em até 10% as emissões de gases do efeito estufa no alto-forno.
Patrícia Seoane observa que o Brasil tem capacidade produtiva para atender rapidamente a um crescimento mais forte da demanda chinesa por minério de ferro. No entanto, ela vê um cenário pouco positivo para a indústria mineradora em relação às cotações do ferro. “Há um excesso de oferta e os estoques estão em alta”, afirma. “Além disso, a entrada em operação de novos projetos, como o de Simandou, na República da Guiné tendem a aumentar a oferta de ferro disponível no mercado global.”
Na visão da economista Rita Silva, professora da Universidade Positivo, esse cenário tende a manter as cotações em baixa por mais tempo. “Mesmo que a demanda chinesa aumente, a alta dos estoques compensaria o efeito sobre o preço”, avalia. Quanto ao aumento da oferta disponível, ela acredita que as mineradoras saberão controlar a produção para manter o mercado em equilíbrio.
Jorge Guinle, CEO da Timbro, empresa brasileira de trading, observa que apesar do comportamento errático, o mercado de minério de ferro apresenta boas oportunidades na China. Segundo ele, a empresa pretende investir em um trade próprio de mineração no país, para importar o ferro e comercializar o minério no mercado chinês. “Isso abre a possibilidade de trabalhar com minério de diferentes origens, para criar a melhor oferta de qualidade e preço”, explica.
A grande incógnita do mercado, no entanto, ainda são os efeitos da guerra global de tarifas deflagrada pelo presidente americano Donald Trump. “Embora o minério de ferro tenha sido pouco afetado diretamente, ainda não conseguimos enxergar todo o impacto desse cenário, caso não se chegue a um acordo sobre as tarifas”, alerta Patrícia, da PwC. “O Brasil tem uma oportunidade de ocupar espaços no mercado, a depender de sua capacidade de se manter neutro nessa guerra.” Um acordo entre EUA e China começou a ser negociado esta semana e deve trazer novos elementos a essa equação.
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