As regras mais duras da licitação do lote “Rodovias Centro-Oeste Paulista” pesaram no resultado da concorrência, que teve ontem a fase de entrega de propostas. Apenas EcoRodovias e um fundo de investimentos do Pátria apresentaram a documentação, número abaixo da expectativa da Artesp, a agência reguladora de transportes do Estado de São Paulo. Amanhã será definida a data da abertura das propostas de preço, que deve ocorrer no início de março.
O presidente da EcoRodovias, Marcelino Seras, disse que a empresa está confortável com a proposta. “Obviamente, a companhia busca taxa interna de retorno. É um projeto em São Paulo, que ‘é um país’, tem relevância enorme com relação a pujança, potencial e solidez”, disse ao Valor.
O baixo número de propostas surpreendeu. Alguns interessados consideraram que as regras da licitação representavam um risco alto. O lote Centro-Oeste Paulista tem 574 quilômetros de rodovias, cruzando o Estado de São Paulo desde Florínea até Igarapava.
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Para Seras, porém, o contrato prevê obrigações que já existem na prática em concessões rodoviárias atuais. “Se não estão nos contratos, estão nas normas, nos regimentos. Não temos medo nenhum.”
O grupo tem sete controladas rodoviárias e nos últimos anos adotou como estratégia manter o foco em seu negócio principal: concessões de rodovias. O Pátria não tem investimento direto no setor. Como não é operador, terá de subcontratar um qualificado ou montar uma empresa para atuar com essa finalidade. Procurada, a empresa disse que não falaria.
Contrariando as expectativas, a Arteris, que hoje administra um trecho que integra o lote e cuja concessão vai até março de 2018, não entrou na disputa. Por meio de nota, informou que a decisão foi tomada “com base em estudos técnicos que apontaram que a rentabilidade esperada seria inferior à exigida pela empresa, considerando os riscos assumidos.
A CCR, maior grupo brasileiro de concessões de infraestrutura de transportes, desistiu na véspera. O tráfego projetado nos estudos da Artesp para o meio de 2018, quando começará a cobrança de pedágio, ficou 10% acima do estimado pela companhia. Apesar de o estudo do poder concedente ser meramente indicativo e não vinculante, a empresa não viu viabilidade. Além disso, avaliou que os investimentos necessários são maiores do que os requeridos no edital.
Em relação às questões regulatórias e contratuais, a CCR considerou que algumas novidades trazem risco para o concessionário. Uma delas é não haver plano de negócios, o que, segundo o diretor de Novos Negócios da empresa, Leonardo Vianna, tira a confiabilidade dos futuros reequilíbrios.
Outro aspecto é a previsão de que o banco é obrigado a obedecer a qualquer notificação do poder concedente para transferir recursos da conta a ser criada para a concessionária receber as receitas da concessão. “É uma interferência que hoje não existe”, citou, destacando ainda riscos não gerenciáveis alocados na concessionária.
A entrega das propostas do próximo leilão de rodovias paulistas – o do lote dos Calçados – ocorre no dia 25 de abril. Os documentos da licitação são semelhantes aos dos lote do Centro-Oeste, contudo, a CCR diz não ser possível afirmar se, por isso, deixará de concorrer. “Tem 60 dias, até lá o governo pode melhorar as questões regulatórias”, disse Vianna, o que permitiria calibrar a viabilidade econômica do projeto.
Na visão da Artesp, apesar do menor número de licitantes – a estimava era de cerca de cinco concorrentes -, o resultado foi positivo. O diretor-geral da agência, Giovanni Pengue Filho, disse que o objetivo era trazer operadores e investidores com capacidade de fazer os investimentos. Entre outorga e investimentos o lote vai exigir R$ 4,7 bilhões, sendo R$ 794,5 milhões de outorga – metade dela paga à vista. Vence quem der o maior ágio sobre essa parcela. O restante, R$ 3,9 bilhões, é de investimentos, sendo R$ 2,1 bilhões nos primeiros anos.
“Em função do atual cenário que temos hoje no país, nos últimos dois anos todos os processos de concessão tiveram praticamente um participante, no máximo dois”, disse Pengue, destacando que são duas empresas com participação internacional, “no perfil que nós estávamos procurando, investidores de longo prazo, empresas sérias”.
É a primeira vez que um fundo de investimentos participa de um leilão de rodovias. O Pátria é parceiro do fundo Blackstone, um dos maiores do mundo, no Brasil. Já a EcoRodovias é co-controlada pelo grupo italiano Gavio. Segundo Pengue, este leilão trouxe uma série de inovações. “É um modelo que incentiva o operador, o financiador, não é para empreiteiros, a gente falou isso desde o começo.”
O presidente da Comissão de Obras Públicas da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, Carlos Lima, diz que a baixa procura é uma resposta ao modelo de exigir outorga “alta” e priorizar um trecho “extenso”, o que deixou de fora empresas médias.
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