Ela nasceu no tempo do império, sob as bênçãos de dom Pedro II, com o prestígio do tamanho de sua responsabilidade: cuidar da riqueza do Brasil, transportada em trilhos de ferro. Foi a primeira corporação policial especializada do país. Hoje, 155 anos depois, ela ostenta outro título, com bem menos glamour: o de menor polícia do mundo. A privatização das ferrovias brasileiras, em 1996, atirou definitivamente a Polícia Ferroviária Federal (PFF) no esquecimento: poucos sabem que ela existe, apesar da previsão constitucional. O efetivo de 3,2 mil homens antes das concessões se reduziu a 780, para fiscalizar 26 mil quilômetros de trilhos, destinados ao transporte de carga. Em Minas, estado com a maior malha ferroviária, são 17 homens, mas apenas seis trabalham. Férias e licenças médicas desfalcam ainda mais a corporação.
Se existe um choque entre o passado glorioso da “Polícia dos Caminhos de Ferro”, como foi chamada em 1952, e a realidade, outras incoerências marcam a história da corporação. Legitimada pela Constituição, ela foi contemplada com um órgão administrativo – Departamento Nacional de Polícia Ferroviária Federal, ligado ao Ministério da Justiça. Em 1993, foram criados cargos em comissão para montar a estrutura da PFF e nomeado um diretor. Ele ocupou o cargo por sete anos, mas conseguiu a façanha de comandar apenas ele próprio neste período, pois o efetivo da polícia não foi transferido para o Ministério da Justiça. Seus comandados, depois das concessões das ferrovias, foram distribuídos para os ministérios dos Transporte e das Cidades. Hoje, parte deles fiscaliza o transporte de carga e outra, os trens de passageiros urbanos.
PERDAS O tamanho do abandono a que foi atirada a Polícia Ferroviária pode ser traduzido nos mais diversos números. Desde 1996, com a desarticulação da corporação, já foram roubados 500 quilômetros de trilhos e dormentes, uma dilapidação no patrimônio da Rede Ferroviária Federal, hoje em liqüidação, estimados em R$ 12 bilhões. Além disso, pelo menos 10 mil quilômetros de ferrovias, não-privatizadas, estão abandonadas à própria sorte, com registro de várias invasões nas faixas de domínio. O último concurso para a corporação vai completar 18 anos e todo os seus agentes têm mais de 40 anos. No Rio, a falta de investimentos ainda é mais sentida. Sua frota de 33 carros é toda do longínquo ano de 1989. Eles descansam em um prédio da extinta rede ferroviária, porque estão sucateadas.
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O policial Eduardo Coimbra, um dos cinco do efetivo de Minas na ativa, conta que a corporação foi criada por dom Pedro II para evitar que riquezas brasileiras, como o café e outras especiarias, fossem saqueadas ao longo das ferrovias. “Ele teve uma visão histórica porque, além de cuidar das riquezas do país, com a Polícia dos Caminhos de Ferro conseguia também evitar o transporte de cargas que não gerasse renda para a Coroa”, conta Coimbra. A Polícia Ferroviária foi criada em junho de 1852 e regulamentada pelo Decreto nº 1930, de 26 de abril de 1857. Cinco anos depois, em 1862, ela ganhou mais funções com a regulamentação de novo decreto pelo conselheiro do estado, senador do império, ministro e secretário de Estado dos Negócios de Agricultura, Comércio e Obras Públicas, Manoel Felizardo de Souza e Melo, com poderes ampliados.
LETRA MORTA A cada ano, a corporação era mais valorizada e, em 1963, com a criação da Rede Ferroviária Federal, a hoje Polícia Ferroviária recebeu novo nome “Polícia das Estradas de Ferro”. Dez anos mais tarde, o prestígio continua em alta e em 11 de dezembro de 1973, o policial vê seus poderes novamente ampliados. O efetivo policial das ferrovias poderia atuar também em casos de acidentes. “Se chegássemos no local primeiro, poderíamos autorizar, independente do exame do local, a imediata remoção das pessoas com lesões e também dos veículos, se estivessem prejudicando o tráfego ou no leito da via pública”, conta Coimbra. A Constituição de 1988 também parecia ser a c
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