Diante do aperto financeiro pelo qual estão passando e da
frustração com as perspectivas do negócio, os controladores do aeroporto
internacional de Viracopos (SP) – Triunfo Participações e Investimentos e UTC –
já consideram a possibilidade de devolver a concessão, segundo apurou o Valor
com fontes ligadas aos acionistas privados.
Se essa hipótese for levada adiante, Viracopos poderá
inaugurar o mecanismo previsto na MP 752, medida provisória convertida em junho
na Lei 13.448 e que introduz a devolução “amigável” ao governo como
alternativa para concessões de infraestrutura problemáticas.
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A decisão ainda não está tomada, mas dois fatores tornam
mais difícil a continuidade da Triunfo e da UTC à frente do ativo: a recente
execução do seguro-garantia pela Agência de Nacional de Aviação Civil (Anac)
pelo não pagamento da parcela da outorga de 2016, cujo valor-base é de R$ 173
milhões, e um enfrentamento com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES) em torno do fluxo de caixa da concessionária.
Além disso, os controladores do aeroporto não digeriram uma
mudança no critério de cobrança das tarifas de armazenamento conhecidas no
mercado pela sigla Teca-Teca. A mudança abrupta fez o consórcio perder receitas
em uma atividade prioritária sem compensações imediatas. O leilão de Viracopos
ocorreu em 2012, mas apenas no fim do ano passado saiu o reequilíbrio econômico
do contrato – ainda assim, de forma parcial.
Originalmente considerado um aeroporto estratégico,
Viracopos ainda não decolou. A concessionária fez investimentos pesados para um
fluxo que não se confirmou. O movimento de passageiros está quase 40% abaixo do
que projetavam os estudos de demanda realizados pelo governo antes da
licitação. A previsão era de que em 2016 o fluxo de passageiros seria de 15,2
milhões de pessoas, mas efetivamente a movimentação ficou em 9,2 milhões,
conforme dados do sistema da Anac.
Essa frustração contradiz a aposta feita pelo grupo, que
ofereceu um ágio de 159% sobre o preço mínimo de outorga para arrematar o terminal.
Os principais acionistas privados têm problemas
particulares. A UTC, grupo de construção neófito em concessões, está envolvida
na Operação Lava-Jato e entrou com pedido de recuperação judicial na semana
passada. Já a Triunfo se endividou ao apostar em diversos projetos de
diferentes segmentos de infraestrutura sem receber, em alguns deles, o
financiamento de longo prazo prometido pelo BNDES. Pediu recuperação
extrajudicial no fim de semana para reestruturar R$ 2,1 bilhões de dívidas.
Ambas as empresas já haviam colocado suas fatias no
aeroporto à venda, mas não tiveram sucesso.
Ainda não está claro como se daria a devolução da concessão,
pois a lei não foi regulamentada. Mas o texto fala em cálculo da indenização e
relicitação do ativo. A indenização pelos investimentos já realizados seria
paga com os recursos advindos da nova licitação.
O Ministério dos Transportes, onde está abrigada atualmente
a Secretaria de Aviação Civil (SAC), ainda acredita na possibilidade de
recuperação de Viracopos. A percepção em Brasília, no entanto, é que o BNDES
tem empurrado a concessionária nessa direção. O banco olha com desconfiança um
contrato fechado pela administradora do aeroporto com a Estapar para exploração
do edifício-garagem. A estratégia de Viracopos foi antecipar o recebimento de
recursos e levantar boa parte do dinheiro como “luvas” na assinatura
do contrato.
Isso foi crucial para obter caixa para o pagamento de
outorga referente a 2016. Ao avaliar a equação financeira, porém, o BNDES não
gostou. A instituição de fomento entende que o estacionamento teria elevado
potencial de geração de recursos ao longo de toda a vigência do contrato e que
a antecipação significaria abrir mão de dinheiro mais à frente. Por isso,
alertou que haveria reflexos da estratégica do plano de negócios da
concessionária e uma possibilidade de se afetar o financiamento de longo prazo.
Ao ser notificada pela Anac, a Triunfo, que tem capital
aberto, comunicou ao mercado que a concessionária mantém R$ 188 milhões desde
dezembro de 2016 em uma conta denominada Outorga, mas que a transferência desse
montante para a conta do Fundo Nacional da Aviação Civil (FNAC) depende de uma
liberação por parte do BNDES, credor de Viracopos. Além disso, a outorga de
2017, que venceu no dia 12 deste mês, também não foi quitada.
UTC e Triunfo são sócias, com 45% cada qual, na Aeroportos
Brasil, fatia privada que detém 51% da concessionária do aeroporto. Os demais
49% são da Infraero. Os 10% restantes da parte privada são da francesa Egis. A
UTC não aportou o último aumento de capital em Viracopos e essa dívida entrou
no pedido de recuperação judicial da empresa. Na prática, a Triunfo não tem
“ombro” suficiente para carregar sozinha o ativo, caso a UTC não faça
mais aportes. Soma-se a isso o fato de a Infraero estar limitada.
Outra questão tida como problema potencial e que espreita o
negócio é a entrada da gigante chinesa HNA no Galeão (RJ), na recente
negociação de compra da fatia da Odebrecht Transport no aeroporto fluminense. A
HNA tem 22% da companhia de aviação Azul, o que pode fazer com que ela
concentre a conectividade de voos da Azul no Galeão. Aproximadamente 85% do
tráfego de Viracopos advém da companhia, que tem planos de expansão nas rotas
internacionais.
Na avaliação de autoridades do setor aéreo, a tendência da
Azul é que ela use o terminal carioca como “hub” para concentrar voos
ao exterior.
Pelo edital do Galeão, “uma ou mais empresas aéreas não
poderão participar com mais de 4% no consórcio”, regra que vale para
empresas aéreas, suas controladoras, controladas e coligadas. Contudo, há no
edital disposição que permite que empresas que possuem operação aeroportuária
entrem no capital da concessionária sem suscitar a discussão do limite. A HNA
tem atualmente 13 aeroportos sob a sua gestão, segundo informações do site.
Uma alternativa menos traumática do que a devolução de
Viracopos seria repactuar o contrato em novas bases. Mas não há previsão desse
mecanismo. Justamente por isso, Brasília considera que seria um caminho muito
mais longo.
Procuradas, Triunfo, UTC e Egis não se manifestaram até o
fechamento desta edição.
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