Um transporte mais rápido, mais barato e menos poluente
poderia impulsionar a infraestrutura brasileira e reduzir os gargalos
logísticos do Brasil. Então, por que as
ferrovias, que na teoria trariam tais benefícios, não “decolam” no país?
Para especialistas do setor, que participaram da sétima
edição do Congresso Brasil nos Trilhos, há alguns fatores travando esse
desenvolvimento.
O principal deles é que falta continuidade nos projetos
de planejamento logístico do país. Como a construção de novas ferrovias é um
projeto de longo prazo, esse plano acaba sendo prejudicado pelas trocas de
governo no Brasil – que normalmente significam o abandono de projetos antigos
em nome de renovação da agenda.
Outro problema, segundo Raymond Atkins, ex-conselheiro do
Surface Transportation Board, nos Estados Unidos, é que o prazo das concessões
ferroviárias no Brasil, que hoje dura 30 anos, é muito curto.
“O planejamento de uma ferrovia é de longo prazo, estamos
falando em 60, 70 anos. É absurdo ter que renegociar com o governo nesse prazo
que vocês têm. Vocês precisam se perguntar se o modelo de ferrovia funciona
assim mesmo”.
Por outro lado, representantes do mercado se mostraram
otimistas quanto à possibilidade de renovar antecipadamente as concessões que
venceriam em 2028. O processo de renovação tem muitas etapas, mas a secretaria
especial do governo do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI) montou uma
força-tarefa junto com as empresas e junto com o Tribunal de Contas da União
(TCU) para que as decisões saiam até o final do ano.
Tanto Julio Fontana Neto, Guilherme Mello, Marcello
Spinelli, que são presidentes, respectivamente, da Rumo, da MRS e da VLI,
quanto Giane Zimmer, diretora de operações centro-oeste da Vale, e Marcello
Barreto Marques, diretor comercial da Ferrovia Transnordestina, disseram
acreditar que a renovação antecipada desses contratos vai destravar investimentos
importantes no setor.
Esse impulso pode ser relevante, mas não será suficiente
para resolver a crise logística do país, segundo Venilton Tadini,
presidente-executivo da Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de
Base (Abdib). Ele lembra que, apesar do esforço e das boas intenções, o país
está há 30 anos sem nenhum tipo de planejamento estratégico.
“Fazer PPP [parceria público-privada] e concessão não
‘cura mau olhado e traz a pessoa amada de volta’ porque a malha ferroviária
precisa se integrar aos outros setores econômicos. A participação do Estado é
fundamental, e por mais que as pessoas digam que estamos saindo da recessão,
nós não estamos”, afirmou.
“A PEC do teto foi a medida mais cruel que poderia ter
sido tomada agora porque trava o investimento. Em plena recessão, o país tem
gargalo de infraestrutura. Precisamos crescer acima da demanda, e sem
investimento [do setor público], esse entusiasmo pode ser um voo de galinha”,
analisou Tadini.
O que o país ganharia com mais ferrovias
Uma rede ferroviária ampla e interligada beneficiaria
todo o processo produtivo e o escoamento das exportações brasileiras. “É custo
Brasil na veia”, resumiu o secretário de projetos da secretaria do PPI no
governo, Tarcísio de Freitas.
Um estudo do professor da EAESP/FGV, Gesner Oliveira, e
do diretor do Ipea, Fabiano Pompermeyer, mostrou que as ferrovias representam
apenas 15% da estrutura de transportes no Brasil, um percentual considerado
baixo.
A predominância do transporte rodoviário (que representam
65% do total) atrapalha o trânsito nos grandes centros, é mais poluente, deixa
as empresas mais suscetíveis a roubos de carga, custa mais e leva a mais
acidentes.
Um vagão graneleiro comporta, em média, 100 mil toneladas
de grãos, enquanto um caminhão bi-trem transporta apenas 36 toneladas, segundo
o comparativo dos especialistas. Mesmo assim, o país tem mais de 300 mil
quilômetros de rodovias, e pouco menos de 30 mil quilômetros em ferrovias
Com a substituição gradual do transporte agrícola pelo
sistema ferroviário, a economia estimada seria de 30%, devido a maior
capacidade dos trens. Outro problema, no entanto, é que a grande maioria (22
mil quilômetros de um total de 29 mil) das ferrovias brasileiras foi construída
com bitola métrica, um método considerado ultrapassado e menos seguro.
A substituição também acarretaria em uma economia de 15,8
milhões de reais ao ano em gastos com acidentes de trânsito (já que com menos
caminhões circulando, o número de acidentes diminuiria).
Além disso, na situação atual, o transporte rodoviário é
responsável por 95% das emissões de gás carbônico (CO2), enquanto o ferroviário
representa apenas 5%.
Veja um resumo dos benefícios das ferrovias sobre as
rodovias, segundo os especialistas que falaram no Congresso Brasil nos Trilhos:
Redução de conflitos urbanos (menos atropelamentos e
menos congestionamentos dentro das cidades);
Redução de acidentes;
Aumento da capacidade de transporte (já que os vagões
comportam mais carga que os caminhões);
Redução do custo de transporte ferroviário em relação ao
atual, devido à maior eficiência operacional propiciada pelos investimentos;
Redução da emissão de poluentes devido à migração de
cargas da rodovia para a ferrovia.
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