Sem
condições de realizar os investimentos a que se propôs para o modal
ferroviário, o governo federal está repassando à iniciativa privada a
responsabilidade de executar obras consideradas estratégicas. Concessionárias
de ferrovias poderão renovar contratos que vencem em meados da próxima década
por mais 30 anos (ficando vigentes até 2057). Como contrapartida, a União
abrirá mão de outorgas, e as empresas construirão outras estradas de ferro,
cujas operações serão, posteriormente, licitadas. Cinco operadoras já estão em
processo para ter o aditivo: Rumo Malha Paulista, Estrada de Ferro Carajás,
Estrada de Ferro Vitória-Minas, Ferrovia Centro-Atlântica e MRS Logística. As
empresas prometem investimentos na ordem de R$ 58 bilhões.
Para
assegurar a antecipação dos contratos, o governo editou a medida provisória nº
752, de 2016, já apreciada e votada pelo Congresso Nacional e convertida na lei
nº 13.448/17. Dois projetos terão prioridade nas contrapartidas dos projetos de
renovação. A Vale construirá o trecho de 383 km da Fico (Ferrovia de Integração
Centro-Oeste), entre Água Boa (MT) e o entroncamento com a Ferrovia Norte-Sul
em Campinorte (GO). A MRS Logística terá a concessão renovada em troca da
construção do ramal de 53 quilômetros do Ferroanel de São Paulo.
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A medida,
entretanto, está sendo questionada pelo Ministério Público Federal, que entrou
com uma ação direta de inconstitucionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal).
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em sua petição, afirma que “a
lei contém dispositivos que contrariam os princípios constitucionais da
eficiência, da impessoalidade, da moralidade e da razoabilidade, além de violar
a regra da licitação e comprometer a qualidade dos serviços oferecidos à
sociedade”.
Apesar do
impasse, os projetos estão caminhando. De acordo com o secretário de
Coordenação de Projetos da Secretaria do PPI (Programa de Parcerias de
Investimentos), Tarcísio Gomes de Freitas, todas as audiências públicas devem
ser abertas em setembro e os projetos encaminhados ao TCU (Tribunal de Contas
da União). O secretário rechaça o entendimento da PGR e afirma que a renovação
antecipada atende ao interesse público, cumpre os requisitos legais e é
vantajosa por permitir a correção de uma série de problemas nos contratos. “Eles
foram feitos segundo uma lógica fiscal, não tinha obrigação de fazer
investimento, não tinha uma série de servidões.” Segundo Freitas, agora, os
acordos serão mais reguláveis. “Haverá gatilho de capacidade, isto é, o
concessionário terá de fazer obras quando esse gatilho estourar, de maneira que
sempre tenha carga disponível para terceiros.”
A MRS
considera que a renovação significa a possibilidade de manter a evolução que
vem promovendo desde o início da concessão em 1997. Em nota, a concessionária sustenta que está
sendo desenhado um modelo regulatório com muito mais responsabilidade para as
empresas e baseado em resultados e no nível do serviço prestado. “A MRS
obviamente enfrenta desafios, como as interferências de e sobre as cidades
pelas quais nossa malha passa (na região mais densa e produtiva do Brasil), mas
tem histórico não só de atendimento ao que estipula o contrato como também de
melhoria constante da qualidade da via, confiabilidade de material rodante,
redução de tempos, eficiência energética e avaliação positiva dos clientes.”
Melhor
alternativa
Entre os
questionamentos à iniciativa do governo, também está o fato de alguns setores
considerarem que as discussões para formatar a medida foram precipitadas e não
levaram o tempo suficiente para extrair a melhor alternativa. No entanto, o
diretor-executivo da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores
Ferroviários), Fernando Paes, explica, em artigo enviado à reportagem, que a
renovação antecipada foi incluída no Programa de Investimento em Logística do
governo federal em junho de 2015. “A agenda tem mais de três anos de discussões
por parte dos agentes públicos e da sociedade civil, incluindo juristas e
economistas especializados. Já foram realizadas audiências públicas para
debater a questão, e várias outras estão previstas nos próximos meses.”
De acordo
com a ANTF, ao assumirem a malha, as concessionárias desoneraram o Estado,
arrecadaram quase R$ 40 bilhões para o governo em outorga, arrendamento e
tributos. Além disso, nos últimos 21 anos, investiram R$ 92 bilhões no sistema
ferroviário, o que permitiu um aumento de 173% na produção ferroviária e um
crescimento de 113% na movimentação de cargas.
O professor
da FGV (Fundação Getulio Vargas) e especialista no setor ferroviário, Armando
Castelar, avalia que a antecipação das renovações é o melhor caminho para
ampliar a participação do modal ferroviário no transporte de cargas. Para ele,
o atual momento político do país justifica a tentativa de transferir a
responsabilidade de construção para um agente privado. Ele frisa que precisa
estar “tudo amarrado” e chama atenção para as vantagens da mudança contratual,
além dos investimentos.
Castelar
defende a prorrogação por ela permitir saber de onde virá o investimento. “São
empresas com acesso a mercados de capitais, com receitas, e com capacidade de
investir, porque já o fazem.” Ele também destaca o elemento da eliminação de
conflitos urbanos, principal causa de acidentes ferroviários no país, como
passagem em nível, invasão de faixa de domínio.
Fonte: http://www.cnt.org.br/imprensa/noticia/renovacao-concessoes-devem-injetar-bilhoes-ferrovias
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