Seria injusto acusar o presidente Jair Bolsonaro de ser o único responsável pelos sinais preocupantes de que investidores estrangeiros abandonam o Brasil. Há uma grave crise mundial, deflagrada pelo novo coronavírus, e os problemas que o país jamais conseguiu resolver terminaram agravados pela pandemia. Mas Bolsonaro é o único culpado por tornar uma situação já difícil ainda pior – e por impedir que encontremos saídas razoáveis para ela. A fuga de capitais do país, sintoma da piora na percepção da economia (e da política) pelos agentes financeiros internacionais, é um alarme que já soa há algum tempo.
Foi reforçado pelos últimos números do Banco Central. De janeiro a agosto, saíram do Brasil US$ 15,2 bilhões, volume mais alto desde que o BC começou a somar esse fluxo, em 1982. Entrada e saída de investimentos financeiros são parte do cotidiano da economia global. O que mais preocupa é a retração nos investimentos diretos: os US$ 22,8 bilhões no primeiro semestre significaram uma queda de 27% em comparação com o mesmo período de 2019. Ao jogar o Brasil no limbo da comunidade internacional, com atos e declarações que minam a estabilidade institucional, Bolsonaro fecha as portas a quem pode trazer os investimentos pesados necessários ao crescimento: empresas estrangeiras. Era essa, por sinal, a promessa original, trazida na campanha pelo plano de privatizações do ministro Paulo Guedes.
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A lógica de privatizar as estatais é atrair capital para as empresas poderem investir, algo que o poder público simplesmente não tem como fazer. Com um Estado que gasta 94% do Orçamento em custeio, os investimentos públicos desabaram. Os privados foram contidos pela crise e pela incerteza política. No quarto trimestre de 2019, o total gasto na formação bruta de capital cresceu 2,2%, de acordo com o IBGE. Mas, no segundo trimestre de 2020, recuou 2,1%. A série histórica mostra que os investimentos estão num atoleiro.
Para investir em infraestrutura, séria carência nacional, resta a iniciativa privada. Os empresários brasileiros continuam na expectativa de um programa de reformas que permita um planejamento mínimo de médio e longo prazos. Os de fora, o presidente trata de assustar cada vez mais, como mostra seu pronunciamento na ONU.
É como se não soubesse das enormes necessidades de capital. Pior, talvez possa imaginar, como já aconteceu não faz muito tempo, que isso depende de vontade política. Os números são irrefutáveis. Embora a poupança privada tenha sido beneficiada pelo auxílio emergencial e por outras medidas tomadas contra a crise – cresceu 6% do PIB, enquanto o setor público acumulou déficits -, a taxa total de poupança da economia continua baixa, pouco acima dos 15% do PIB. O ideal para suprir a carência de investimento é no mínimo uns 20%. A economia entrou em movimento via consumo. A massa de recursos necessários para manter e ampliar redes de transporte, energia e comunicação depende de atrair os empreendedores que Bolsonaro espanta.
Fonte: https://oglobo.globo.com/opiniao/fuga-de-capital-externo-liga-alarme-1-24656568
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