Fundos de pensão como a Previ, alvo do Centrão, administram R$ 1 tri. Veja por que comando deles é tão disputado

Fundos de pensão constituem grandes patrimônios a partir da contribuição de empregados ao longo de suas carreiras e investem os recursos para garantir aposentadoria dos participantes Foto: Editoria de Arte
Fundos de pensão constituem grandes patrimônios a partir da contribuição de empregados ao longo de suas carreiras e investem os recursos para garantir aposentadoria dos participantes Foto: Editoria de Arte

O Globo – Com um patrimônio que soma R$ 1 trilhão, o equivalente a cerca de 13% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, os fundos de pensão se tornaram agentes importantes da economia e do mercado de capitais brasileiro.

Os maiores são os de funcionários de estatais como Banco do Brasil (Previ), Petrobras (Petros), Caixa (Funcef) e Eletrobras (Real Grandeza).

Essas entidades de previdência estão atualmente entre os principais investidores de longo prazono país. São sócios e influenciam a gestão e o financiamento de grandes empresas.

Em muitas, nas quais têm participação acionária relevante, indicam representantes para os conselhos de administração, que tomam as decisões estratégicas das companhias, como investimentos.

Portanto, os fundos de pensão podem influir até mesmo na retomada da economia ou no impulso a um determinado setor.

É esse poder econômico que atrai a cobiça de partidos políticos por indicações em cargos chaves nos fundos.

A troca de diretores indicados pela Caixa na Funcef recentemente e o pedido de demissão, na última terça-feira, do presidente da Previ, José Maurício Coelho, evidenciaram a intervenção do presidente Jair Bolsonaro nas estatais que têm poder de indicar parte dos dirigentes dos fundos.

Esses cargos são cobiçados por partidos da base política do governo, como os do Centrão. Nas últimas décadas, essas entidades de previdência foram marcadas por escândalos de corrupção.

— Os fundos são grandes investidores tradicionais no Brasil. Se reforçaram durante as privatizações e participaram praticamente de todos os setores, da (mineradora) Vale à telefonia. Se tornaram tão importantes a ponto de serem alvo de interferências políticas — diz Sergio Lazzarini, professor do Insper, lembrando que os principais fundos, patrocinados por estatais, ficam sob influência do partido e do governo que está no poder.

Tire suas dúvidas sobre os fundos de pensão
Para que eles servem?

A função primordial dos fundos é a de complementar a previdência oficial de trabalhadores de empresas privadas, estatais, ou entidades de classe, associações e cooperativas, que não devem ter fins lucrativos na oferta de previdência.

No ano passado, as entidades de previdência complementar fechadas (que só permitem a admissão de funcionários e seus dependentes) encerraram com 2,7 milhões de participantes ativos, 3,9 milhões de dependentes e 837 mil aposentados.

Só em benefícios aos aposentados, foram pagos R$ 68 bilhões. São mais de 300 instituições, que juntas administram pouco mais de 1.100 planos de benefícios.

A Petros tem o maior número de participantes: 450 mil, com R$ 112 bilhões em ativos.

A Previ vem em primeiro em ativos sob gestão — R$ 230 bilhões — e em segundo em número de participantes: 430 mil.

Como é formado o patrimônio?
O patrimônio desses fundos é constituído das contribuições mensais dos empregados e também dos empregadores. Quase sempre, as empresas depositam o mesmo valor que os empregados no fundo, o que estimula a participação.

Como os fundos garantem que terão recursos para pagar as pensões complementares dos participantes quando eles se aposentarem?

Os fundos aplicam os recursos em ações, imóveis, fundos imobiliários, projetos estruturados de infraestrutura e ativos no exterior.

Os fundos também costumam fazer empréstimos a seus participantes, com taxas de juros mais baixas do que a cobrada nos bancos.

Por que eles fazem diferença na economia?

O objetivo dos investimentos de um fundo de pensão é multiplicar seus recursos para que eles se transformem no pagamento de benefícios no futuro, em prazos de até 30 anos.

Isso favorece o investimento dos fundos em negócios de longo prazo, como concessões de infraestrutura ou empresas em fase de expansão.

Como mobilizam montantes muito altos de dinheiro, eles conseguem viabilizar projetos que favorecem o desenvolvimento econômico e a geração de empregos.

— Os fundos são investidores de longo prazo, e podem ser mais pacientes — diz Lazzarini, do Insper.

O que chama a atenção é o montante disponível para investir: só a Previ tem R$ 55 bilhões em ações da mineradora Vale. A Previ investe na Vale desde que ela foi privatizada, nos anos 1990.

A partir dos anos 2000, fundos de pensão como Funcef e Petros participaram de vários projetos na área de energia, como a usina hidrelétrica de Belo Monte, e de mobilidade, como na concessionária que opera o metrô do Rio.

— Eles têm uma enorme capacidade econômica, capaz de alavancar setores considerados promissores — diz o professor Ricardo Teixeira, coordenador do MBA de gestão financeira da FGV.

Os fundos de pensão correm riscos que podem prejudicar seus participantes?

Das decisões de investimentos dos dirigentes depende o pagamento de pensões no futuro. Por cautela com o patrimônio de seus participantes, os fundos aplicavam a maior parte dos recursos em títulos de renda fixa, como os do Tesouro Nacional.

No entanto, com a queda da taxa Selic nos último sanos, eles tiveram que fazer investimentos de maior risco para bater suas metas atuariais.

Isso deixa uma grande responsabilidade sobre os dirigentes na decisão de investimentos. Afinal, quando eles têm prejuízo, seus participantes são obrigados a aumentar a contribuição para garantir o equilíbrio entre os recursos no fundo e o que sai para as aposentadorias.

O professor Ricardo Teixeira, da FGV, afirma que os gestores precisam observar o quão agressivos podem ser para entregar um retorno que supere a inflação.

— Na pandemia, por exemplo, os gestores não sabiam como o mercado financeiro se comportaria. Eles acabaram sendo mais conservadores, indo para a renda fixa para proteger o capital investido — diz Teixeira.

Na Previ, por exemplo, os gestores diminuíram a posição em ações, no início deste ano, com o recrudescimento da pandemia em janeiro.

A Previ adquiriu R$ 5,7 bilhões em NTN-Bs, títulos públicos que pagam juros e a variação do da inflação (IPCA), nos primeiros meses de 2021.

No ano passado, o fundo já tinha comprado R$ 13 bilhões desses papéis, mostrando uma estratégia mais conservadora. Mesmo assim, também comprou ações de quatro empresas que abriram capital na Bolsa ano passado, entre as 27 que fizeram ofertas iniciais (IPOs).

Como os fundos de pensão influenciam empresas privadas?

Com a Bolsa ainda mostrando volatilidade por conta da pandemia, alguns gestores de fundos de pensão venderam participações acionárias para reduzir o impacto negativo em seu portfólio.

Em janeiro deste ano, por exemplo, a Petros vendeu ações da processadora de carnes BRF. Mas ainda assim tem quase 10% de participação na empresa e mantém a indicação de um representante no Conselho de Administração da companhia.

Por suas participações acionárias expressivas em algumas empresas, os fundos indicam representantes tanto no conselho de administração quanto no fiscal, influenciando na gestão e financiamento das companhias.

A Previ, por exemplo, tem 85 assentos nos conselhos de administração e fiscais de companhias como Ambev, Bradesco, Itaú, Itaúsa, BR Malls, B3, Coelba, Gerdau, Lojas Renner, entre outras.

Em 2020, a Funcef fez até um concurso para selecionar oito conselheiros (e oito suplentes) para companhias em que têm participação acionária relevante, entre elas Invepar, Norte Energia, Serra Azul Water Park e Statkraft Energias Renováveis.

A Petros tem representantes no conselho de administração e fiscal de empresas como Invepar, Marcopolo e Norte Energia.

Os fundos de pensão estão vulneráveis à corrupção?

O economista Sergio Lazzarini, do Insper, lembra que os principais fundos de estatais foram alvo de investigação na Lava Jato, que revelou investimentos feitos com viés político em algumas empresas.

Um exemplo foi a Sete Brasil. Os principais fundos de pensão ligados a estatais tiveram perdas nos investimentos feitos na companhia, criada em 2010 para construir, possuir e operar uma frota de navios-sonda para a Petrobras na exploração do pré-sal.

A Lava-Jato mostrou que os projetos foram superfaturados. A empresa entrou em recuperação judicial e frustrou os investimentos dos fundos de pensão.

Lazzarini observa que mesmo com o sucesso de investigações e leis que limitam as indicações políticas nos cargos-chave dos fundos, a governança dos fundos ainda precisa ser aprimorada.

Fonte: https://oglobo.globo.com/economia/fundos-de-pensao-como-previ-alvo-do-centrao-administram-1-tri-veja-por-que-comando-deles-tao-disputado-25035805

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