Folha de S. Paulo – O Ministério Público de São Paulo afirmou nesta segunda-feira (16) que pedirá na Justiça o fim da concessão das linhas 8-diamante e 9-esmeralda, de trens metropolitanos, se o governo paulista não rescindir o contrato com a ViaMobilidade.
“Não há mais acordo”, afirmou o promotor Sílvio Antonio Marques, titular da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público, responsável por uma das duas investigações abertas no órgão para apurar a sequência de problemas, quebras e atrasos de trens nas duas linhas —a outra é a de Justiça do Consumidor.
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A afirmação foi dada após um trem da linha 8 ter descarrilado, pouco depois das 16h desta segunda-feira (16), próximo à estação Lapa, na zona este da cidade de São Paulo.
Passageiros publicaram nas redes sociais imagens de usuários andando pela linha após o trem sair dos trilhos. Não houve vítimas.
A ocorrência desta segunda foi no sentido Itapevi. Até a publicação desta reportagem, o serviço ainda não havia sido liberado. No horário de pico do início da noite, havia superlotação de usuários, que tentavam voltar para casa.
A circulação na linha 8 foi interrompida entre as estações Lapa e Júlio Prestes, no centro.
Segundo a concessionária, às 21h27 os trens passaram a circular por apenas uma via na estação Lapa, com e com maior intervalo entre as estações Júlio Prestes e Itapevi.
Por causa da medida, a operação Paese, de ônibus, que havia sido colocada em operação para transportar os passageiros, foi desmobilizada.
O descarrilamento da última tarde é o segundo em pouco mais de um mês na linha 8-diamante. O episódio anterior foi em 7 de dezembro, quando um trem saiu dos trilhos próximo à estação Domingos de Moraes, também na capital.
O trem do acidente em dezembro é o mesmo que em março de 2022 bateu em uma contenção na plataforma de desembarque da estação Júlio Prestes, no centro de São Paulo. O maquinista foi demitido na época.
Questionada, a Secretaria de Transportes Metropolitanos não diz se vai acatar a recomendação do Ministério Público. Em nota, afirma que o contrato de concessão com a ViaMobilidade para as linhas 8-diamante e 9-esmeralda tem uma série de obrigações e deveres da concessionária para garantir o desempenho operacional.
“O não cumprimento integral dessas obrigações gera a abertura de processos administrativos para a aplicação das sanções contratuais previstas.”
“Sobre os pedidos do Ministério Público, a STM presta todos os esclarecimentos necessários, dentro do prazo, e obedece rigorosamente aos procedimentos previstos em lei”, diz trecho da nota.
A pasta afirma ainda que a CMCP (Comissão de Monitoramento de Concessões e Parcerias) acompanhou o trabalho da concessionária durante a tarde desta segunda-feira e abrirá processo administrativo competente.
A recomendação ao governo para rompimento do contrato foi feita em documento protocolado em dezembro do ano passado. A gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) tem até o próximo dia 26 para responder à orientação, segundo o Ministério Público.
“Desde 27 de janeiro de 2022, quando a ViaMobilidade assumiu as duas linhas, foram causados graves prejuízos aos usuários, ao patrimônio público e a todo o sistema de transportes da região metropolitana de São Paulo”, diz o Ministério Público no ofício.
O texto lembra que a CMCP (Comissão de Monitoramento das Concessões e Permissões), da Secretaria de Transportes Metropolitanos de São Paulo, iniciou diversos processos administrativos de aplicação de multas por descumprimento do contrato de concessão, cujos valores somavam R$ 9,8 milhões.
“É necessária a extinção da concessão para que a estatal CPTM ou outra concessionária privada competente, escolhida por meio de outra licitação, assuma as linhas 8 e 9 de trens metropolitanos de São Paulo, em benefício dos usuários do sistema”, diz, no documento.
De acordo com Marques, a Promotoria pode pedir até três indenizações, além do rompimento de contrato: por danos morais coletivos; danos materiais, se for comprovados problemas provocados na linha e nos trens transferidos da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) à ViaMobilidade; e danos ao consumidor.
Os valores das indenizações devem ser sugeridos pelo Ministério Público à Justiça após a conclusão de relatório sobre as linhas 8 e 9 que está sendo elaborado pelo Núcleo de Engenharia do CAEx (Centro de Apoio Operacional à Execução).
“Os trens e as linhas precisam voltar para a CPTM”, afirmou o promotor Marques, reforçando o que já havia recomendado por escrito em dezembro ao governo estadual.
Além dos inquéritos civis instaurados nas duas Promotorias, o DPPC (Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania), da Polícia Civil, abriu um inquérito policial para investigar os problemas nas duas linhas de trens.
“Equipes realizam diligências para esclarecer os fatos”, diz a Secretaria da Segurança Pública. O inquérito policial foi instaurado a partir de manifestação do Ministério Público.
A falha que ocasionou o descarrilamento em dezembro passado poderia ter provocado colisões entre vagões e acidentes com mortes, segundo o Ministério Público, com base no depoimento de um maquinista que operou trens a serviço da concessionária e relatou falhas.
Em nota, a ViaMobilidade afirma que está no primeiro ano de um contrato de concessão de 30 anos, no qual mais de R$ 1 bilhão já foi investido de um total de R$ 3,8 bilhões previstos para os três primeiros anos. “Melhorias como revisão geral de trens, ação corretiva nos trilhos e inspeção das catenárias e rede aérea, por exemplo, já trazem resultados”, afirma.
De acordo com a empresa, em dezembro, as reclamações e as falhas operacionais tiveram redução de 78% e 76%, respectivamente, na comparação com março. “A ViaMobilidade contratou 36 novos trens, que começam a chegar nos próximos meses”, diz trecho da nota.
Em novembro, a ViaMobilidade se recusou assinar um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) proposto pela Promotoria por causa dos problemas recorrentes nas duas linhas.
Sobre o descarrilamento, a Via Mobilidade pediu desculpas pelo ocorrido e afirmou que técnicos estão apurando as causas.
Em manifestação encaminhada à Promotoria na época, a empresa atribui a responsabilidade das falhas à gestão anterior, da estatal CPTM, que, segundo a concessionária, entregou as linhas em péssimas condições.
A ViaMobilidade é formada pela CCR e pelo Grupo Ruas, que venceram o leilão das linhas 8-diamante e 9-esmeralda da CPTM para a concessão, em abril de 2021. A concessionária começou a operação em 27 de janeiro do ano passado, após período de transição.
A oferta mínima estipulada pelo governo era de R$ 324 milhões, e o consórcio formado pelas empresas vencedoras ofereceu R$ 980 milhões, em valores da época.
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