A logística para o transporte de cargas representa um grande
desafio para o desenvolvimento do Brasil. O modelo mais utilizado é o
rodoviário, que também é o mais poluente. Segundo dados divulgados recentemente
pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), 58,2% das rodovias apresentam
algum tipo de problema, e apenas 12,3% da malha tem pavimentação. São as
estradas malcuidadas o motivo de muitas dificuldades nos fretes brasileiros.
Como solucionar esse problema? Por representarem um sistema
mais seguro e eficiente, as ferrovias têm chamado a atenção de muitos especialistas.
Em 2012, a malha ferroviária era responsável por 25% do transporte no país,
segundo dados do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).
Mas a expectativa é que esse número cresça nos próximos anos.
POD NOS TRILHOS
- Investimentos, projetos e desafios da CCR na mobilidade urbana
- O projeto de renovação de 560 km de vias da MRS
- Da expansão da Malha Norte às obras na Malha Paulista: os projetos da Rumo no setor ferroviário
- TIC Trens: o sonho começa a virar realidade
Para Frederico Bussinger, engenheiro eletricista e
ex-secretário-geral do Ministério dos Transportes, o Brasil está em processo de
renovar os contratos com as concessionárias e construir novas ferrovias. “Esse
modelo tem um desempenho muito melhor em comparação com o rodoviário, e nós temos
grandes obras planejadas. Mas ainda é preciso decidir qual tipo de ferrovia
será implementado. Pode ser com sistema baseado em óleo diesel ou
eletricidade”, diz.
Ferrovias eletrificadas são mais comuns em metrôs e trens
regionais para o transporte de pessoas. A tração elétrica foi deixada de lado
no transporte de carga apesar de serem muitos os seus benefícios, como sua
maior eficiência, que pode ser de até 45%, segundo estudo do Conselho
Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS). Além disso,
o relatório Revolução Energética, divulgado em 2016 e produzido pelo
Greenpeace, diz que os veículos elétricos convertem 60% da eletricidade em
energia para as rodas, enquanto aqueles que usam motores a combustão interna só
convertem cerca de 20%.
A construção de uma ferrovia eletrificada requer
infraestrutura auxiliar que, além dos trens, pode fornecer recursos como
energia, telecomunicações e internet para regiões que antes não tinham esse
acesso. “Caso a malha ferroviária no Brasil seja eletrificada, promoverá também
o desenvolvimento local”, afirma Bussinger.
Segundo o especialista, a escolha pela tração eletrificada é
mais fácil de ser feita enquanto as ferrovias ainda não saíram do papel. “Em um
projeto novo, essa opção fica mais simples. O investimento na ferrovia
eletrificada será maior, mas os custos operacionais serão menores. Com o tempo,
o capital investido retorna na redução de custos, e ainda há a vantagem de
instalar redes de transmissão em regiões do país que antes não tinham energia
elétrica”, diz. O benefício tem sua importância, afinal, um levantamento da
Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), divulgado este ano, concluiu que
ainda existem no Brasil 1 milhão de residências sem luz.
Além de comparar a eficiência entre eletricidade e óleo
diesel, é importante avaliar também o contexto da obra. “Onde essa ferrovia
será construída? Se for em uma região pouco desenvolvida, escolher um sistema
eletrificado pode ser melhor. A usina que vai alimentar a ferrovia, por
exemplo, também pode incentivar a abertura de uma fábrica, afinal, agora haverá
energia disponível. Isso acaba gerando empregos e desenvolvendo a região.
Então, o planejamento deve ir muito além da escolha da fonte de energia”, diz
Jean Carlos Pejo, secretário-geral da Associação Latino-Americana de Ferrovias
(Alaf).
Pejo dá destaque às obras de expansão de ferrovias
planejadas para o Norte. Atualmente, a maior parte da carga transportada é de
minérios, mas o cenário futuro é de aumento no transporte sobre trilhos dos produtos
do agronegócio, principalmente devido ao crescimento da produção de alimentos
no país. Como exemplo, há o projeto da Ferrovia Paraense, que pretende
interligar todo o leste do estado do Pará, e o projeto da Ferrogrão, que vai
conectar a região produtora de grãos do Centro-Oeste ao Porto de Miritituba,
também no estado do Pará.
“As novas ferrovias são de capital privado e as concessões
são longas. A Ferrogrão, por exemplo, prevê 65 anos de concessão. A construção
deve demorar em torno de cinco anos e depois serão mais 60 anos de uso. Caso
nessa região sejam instaladas ferrovias eletrificadas, serão construídas redes
de transmissão e equipamentos de geração localizada de energia. Com a
estrutura, os empresários poderão diversificar seus negócios e ainda levar
eletricidade até as comunidades mais remotas”, explica.
Menos poluição
Ao contrário de sistemas que utilizam o óleo diesel, as
locomotivas que usam apenas a energia elétrica não lançam gases de efeito
estufa e, principalmente, particulados – nome dado às partículas muito pequenas
de materiais sólidos ou líquidos, que causam doenças respiratórias. Para
Bussinger, o incentivo cada vez maior à ampliação da malha ferroviária na
matriz de transporte é um grande passo para o meio ambiente.
“A ferrovia, mesmo a diesel, é menos poluente que o modelo
rodoviário. Termos mais ferrovias, por si só, já melhora muito a situação. Se
nesse movimento a gente aumentar a eletrificação, será um benefício maior
ainda”, explica. A força das rodas dos trens representa, portanto, não apenas
um aumento da eficiência no setor de transporte, mas também uma forma de
cumprir o compromisso assumido pelo país durante a 21ª Conferência das Partes
(COP21), em Paris, em 2015, de diminuir as emissões de gases poluentes na
atmosfera.
Seja o primeiro a comentar