Integração entre transportes é chave para mobilidade urbana

O R7 abordou nesta semana as dificuldades do morador do Rio de Janeiro para se deslocar de casa para o trabalho, assim como os obstáculos de acesso à cultura na região metropolitana. Entre os especialistas entrevistados, todos afirmaram que uma maior integração entre os transportes seria a solução para a locomoção da população fluminense.

Paulo Cezar Ribeiro, integrante do Programa de Engenharia de Transporte da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), destaca que não é necessária a criação de mais modais, mas sim a formação de uma malha que incorpore de maneira mais inteligente os transportes.

“O Rio de Janeiro tem quase todos os modos disponíveis: ônibus, metrô, trem, barca, VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), van, etc. A questão não é incorporar mais um modo, e sim integrá-los de forma física e tarifária”, apontou Paulo Cezar.

Já para Beatriz Rodrigues, coordenadora de transporte público do ITDP (Instituto de Políticas de Transporte & Desenvolvimento), e para Horácio Figueira, consultor em engenharia e transporte de pessoas, a integração não passa só por ônibus ou trens, mas também por bicicletas e pedestres.

“Quando falamos de mobilidade urbana, pensamos que a mobilidade pública não é só transporte, é mobilidade de bicicleta, do pedestre, isso tem que ser integrado com todas as pessoas. É preciso pensar o transporte de maneira diferenciada”, afirma Beatriz.

“A bicicleta é bem vinda, desde que não atrapalhe o pedestre ou o transporte coletivo. Ela tem que ter seu espaço”, diz Horácio. “Se possível, no canteiro de avenidas ou retirar uma faixa de automóveis. Jamais tirar uma faixa do ônibus ou competir com o pedestre na calçada”.

O consultor ainda sugere a criação de um grande corredor metropolitano nas rodovias do Estado, nos moldes do sistema de transporte de Curitiba, no Paraná. Assim, segundo o especialista, as viagens em veículos de baixa capacidade de transporte de pessoas seriam reduzidas.

“O Rio de Janeiro deveria construir corredores nos eixos de rodovias, como Curitiba. É necessário criar um grande corredor metropolitano para que pessoas que foram morar longe possam fazer um deslocamento mais seguro e com tempo de viagem adequado”, complementa Horácio.

Grandes deslocamentos precisam acabar

Embora governos de Estados, incluindo o Rio de Janeiro, tentem aumentar a opção de transportes e fazer com que as viagens entre os destinos seja encurtada, esta ainda sim não seria a solução a longo prazo, de acordo com Paulo Cezar.

Segundo o especialista, “insistir em soluções como ônibus será perpetuar esse problema, pois os veículos trafegam por vias comuns”. Para ele, é importante que sistemas de alta capacidade sejam implantados, porém o ideal é que empresas levem oportunidades de emprego para onde as pessoas moram.

“O usuário da região metropolitana do Rio sofre com a falta de sistemas de alta capacidade, como os trens”, explicou Paulo Cezar. “A solução de longo prazo seria deslocar o trabalho das pessoas para locais próximos de onde moram. Nem sempre isso é possível – vide a Barra da Tijuca, onde parte dos trabalhadores não moram na própria Barra”.

Descentralização é o caminho para o acesso à cultura

A disposição de museus no município do Rio de Janeiro não segue a distribuição demográfica da população da capital. Segundo o Ibram (Instituto Brasileiro de Museus), menos da metade dos museus público e privados estão localizados fora da zona sul ou do centro.

Campo Grande, na zona oeste, e Madureira, na zona norte, juntos reúnem um sexto da população da capital. Entretanto, estes bairros não possuem um museu sequer.

Seguindo o pensamento de Paulo Cezar, Horácio acredita que seja necessária uma melhor distribuição de equipamentos urbanos em todo o Estado para que a população não precise fazer viagens para trabalhar, ou ter acesso à cultura e serviços. De acordo com o consultor, esta discussão passa pela urbanização das cidades e pela especulação imobiliária.

“São municípios que viram dormitórios, têm pouca vida comercial, de serviços, às vezes com pouco emprego”, explica Horácio. “Esse problema passa pela mudança do solo, que é você incentivar que determinados tipos de empresas migrassem para outras áreas. Assim, você conseguiria inverter um pouco esse fluxo, ou seja, essas pessoas viajariam menos ou estariam em um raio mais próximo de suas residências”.

Leis e aplicativos são apostas para reduzir assédio em transportes

Além dos problemas relacionados às longas distâncias percorridas pelos fluminenses, as mulheres do Estado ainda enfrentam o risco de assédio no transporte público. Para a diretora executiva do ITDP, Clarisse Linke, a lotação em ônibus, trens e metrô facilita a ação de abusadores.

“Todos os estudos e discussões que temos feito nesse campo colocam claro que a maior demanda da mulher é um serviço com mais frequência e menor lotação. Os ônibus mais frequentes fazem com que elas fiquem menos expostas, menos tempo no ponto de ônibus e também com que os coletivos fiquem menos lotados”, explicou Clarisse.

A diretora executiva do ITDP também destacou que áreas destinadas apenas para mulheres nos transportes públicos não funcionam como ações educativas, embora esta medida seja aprovada por grande parte do público feminino. Clarisse destaca que essa distinção de espaços pode criar um pensamento que fora de trens e ônibus seja permitido o assédio.

“Eu não sou completamente contra [vagões e ônibus destinados], mas focar só nos veículos é uma forma de possibilitar que a violência à mulher continue. Você fala ‘tudo bem, aqui dentro do vagão você não pode, mas no restante você pode’. Tem uma mensagem subliminar aí que é importante porque a gente tem uma luta mais ampla contra o assédio e violência.”

Uma pesquisa feita com mulheres fluminenses mostra que 81% dos homens não respeitam o vagão destinado ao público feminino nos trens da SuperVia  e que apenas 11% do público alvo se sente confortável no espaço reservado, segundo dados retirados do site da ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos).

Como medida contra abusos em transportes, a Prefeitura de Fortaleza, no Ceará, criou uma ferramenta para smarthphones batizada de Nina. O dispositivo é um botão para denunciar casos de assédios em transportes públicos. O projeto é uma tecnologia que rastreia e centraliza os abusos nos meios de transporte. Instaurado em março deste ano, a Nina pode ser integrada a qualquer aplicativo de celular.

Segundo Clarisse, a tecnologia desenvolvida na capital do Ceará pode ser implementada em outras cidades e ajudar no combate ao abuso em transportes públicos.

Fonte: https://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/rj-integracao-entre-transportes-e-chave-para-mobilidade-urbana-20092019

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