O governo federal não cortou o oxigênio das empreiteiras envolvidas no escândalo desencadeado pela Operação Lava Jato. A presença das principais construtoras do país entre as investigadas pela Justiça e pelo Ministério Público é discreta na relação das empresas que tinham crédito a receber do governo federal e foram inscritas nos restos a pagar processados (RAP) este ano. Esta rubrica se refere a créditos empenhados e não pagos até 31 de dezembro, para empresas liquidadas.
Na área de investimento, os RAP inscritos do último exercício ou dos anos anteriores doma R$ 8,87 bilhões. Apenas 4,3% deste total, ou R$ 388 milhões, se referem a dívidas do governo com os grupos citados na Operação que investiga irregularidades, de acordo com levantamento realizado pela ONG “Contas Abertas”, a pedido doValor.
Na última semana, o governo federal disciplinou o tratamento em relação aos restos a pagar este ano. Em um decreto, o 8.407, foram bloqueados os restos a pagar não processados, ou seja, referentes a despesas que não chegaram a ser realizadas. Em outro, o 8.412, fixou um cronograma para o pagamento de atrasados até abril. O montante referente a investimentos é uma fração quatro vezes inferior ao total global de restos a pagar de acordo com governo federal, que somam R$ 38,5 bilhões, considerados apenas os processados.
De acordo com o levantamento da “Contas Abertas”, a presença das empresas arroladas na Lava-Jato também é discreta no total pago pelo governo federal em investimentos no ano passado. Dos R$ 57,2 bilhões dispendidos pelo Tesouro para despesas desta categoria, R$ 3,59 bilhões, ou 6,3% do total foram para as empresas que estão sob investigação.
“Este é um sinal, que já tinha sido percebido em uma ocasião anterior, quando a empreiteira Delta foi declarada inidônea. As empresas investigadas podem continuar tocando as obras, cumprindo os contratos e até mesmo celebrando aditivo”, disse o secretário-geral da ONG, o economista Gil Castelo Branco.
Procuradas pelo Valor, a Odebrecht e a Queiroz Galvão, que são as duas empreiteiras investigadas que tem mais créditos a pagar processados inscritos em investimento, não quiseram comentar o assunto.
O Ministério da Fazenda, autor do decreto 8.412, respondeu por meio de nota que já foram pagos em janeiro R$ 38,8 bilhões em restos a pagar. O órgão afirmou que não dispõe de informações sobre pagamentos e créditos específicos de empresas, já que este detalhe estaria no âmbito dos ministérios em que as despesas foram realizadas.
O levantamento realizado pela ONG não leva em consideração os contratos que estão em curso com a Petrobras, contratante de boa parte dos serviços das empreiteiras investigadas
Nas últimas semanas, empresas se queixaram de estarem recebendo com atraso do governo federal. As reclamações foram feitas com mais ênfase, em artigos e entrevistas, pelo ex-ministro de Infraestrutura João Santana, presidente da Constran, empreiteira que não está diretamente envolvida na Lava-Jato, mas que faz parte do grupo UTC.
“Em quase 60 anos de história é a primeira vez que não recebemos nem sequer para honrar a folha de pagamento da obra”, disse o executivo em artigo publicado na “Folha de S. Paulo”.
Procurada pela reportagem, a Constran, que tem R$ 47 milhões a receber do governo por obras já executadas nas ferrovias Norte-Sul e Fiol, não quis comentar.
Já a OAS, que segundo o levantamento teria R$ 11,5 milhões a receber referente a obras rodoviárias nas divisas entre Alagoas e Sergipe e Alagoas e Pernambuco, informou, por meio de nota, que “todas suas operações estão sendo executadas de forma normal e no curso dos negócios”.
A Camargo Corrêa, que teria a receber R$ 18 milhões, sendo a maior parte referente a uma obra rodoviária na divisa de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, disse desconhecer a informação. A Mendes Júnior não comentou.
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